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Mostrando postagens de fevereiro, 2012

Código Penal - I

Todo Código Penal tem duas partes: a geral e a especial. Na primeira estão os dispositivos legais aplicáveis a todos os crimes (legítima defesa, concurso de pessoas [fenômeno em que várias pessoas participam do mesmo crime], formas de cumprimento da pena [regimes: aberto, semi-aberto e fechado], livramento condicional, etc); na segunda estão definidos os crimes em espécie (homicídio, extorsão mediante sequestro, peculato). A parte geral do nosso código é de 1984; a especial, de 1940. Quando a mídia afirma que o nosso código é muito antigo, está evidentemente referindo-se à parte especial (mas ela não sabe disso...). E, a partir dessa afirmação, faz outra, como consequência: que é necessário um novo código. É óbvio que nos anos posteriores a 1940 (e são anos...) os valores que surgiram e mereceram proteção penal tiveram essa tutela deferida por leis extravagantes: meio ambiente, porte ilegal de arma, entorpecentes (quatro leis; a última trata do assunto como "drogas"). O sena

Túmulo do samba

O grande compositor Vinicius de Moraes (além de compositor, diplomata), teria dito, certa vez, que São Paulo era o túmulo do samba. Ele, timidamente, tentou adocicar estas palavras. Era conhecido não apenas por suas grandes composições, algumas delas vertidas para outros idiomas (como exemplo: Garota de Ipanema), como pela vida atípica que levava (diz a lenda que ele tomava banho de banheira [comum, na época] ingerindo uísque em grande quantidade: uma banheira de uísque...). Pois bem: parece que uma parte das escolas de samba que desfilam em São Paulo quer demonstrar que o grande poeta tinha razão. O espetáculo que foi transmitido ao vivo no dia da apuração dos votos, com pessoas invadindo o local da apuração e dilacerando os votos, depois saindo em desabalada carreira, e, para finalizar, ateando fogo em carro alegórico (sem dizer das "voadoras" contra a cerca que limita com a Marginal) foi digno de figurar em qualquer anedotário. Ou boletim de ocorrência. As escolas de sam

Jet Ski

A "bola da vez" é o acidente do jet ski: descobriram agora que esse veículo pode causar acidentes com mortes e ferimentos. É no mínimo curioso - para não usar outra expressão, talvez chula - como a atenção das autoridades muda conforme o vento, por assim dizer: parece uma biruta de aeroporto. É cíclico. Durante a década de 90, mais para o seu final, descobriram que remédios para doenças graves eram falsificados e toda a atenção se voltou para isso. Chegou-se ao ponto de modificar o Código Penal para que esse delito fosse considerado hediondo, com penas muito mais graves (como se isso resolvesse alguma coisa). Mais recentemente, precisamente durante o ano passado, a atenção da mídia foi voltada para a embriaguez ao volante resultando em acidente, com morte e lesões corporais: passaram as autoridades - e a polícia tinha orientação nesse sentido - a encarar o fato como doloso e não simplesmente culposo, como é na maioria dos casos (merecia transcrever aqui, "in totum"

Brasil Open 2012

Realiza-se em São Paulo, desde segunda-feira 13/2, em sua 12ª edição, o Brasil Open de Tênis, torneio da categoria 250 da ATP (ou seja, o ganhador obtém 250 pontos e aproximadamente 85.000 dólares). Até o ano passado realizava-se - inexplicavelmente (ou talvez, explicavelmente para alguns) - na Bahia, na Costa do Sauípe. Sem nenhum preconceito, óbvio, a Bahia não tem nenhuma tradição nesse esporte; além disso, como o turismo interno - todos sabem - é muito caro, era praticamente proibitiva a ida para assistir ao torneio. Fiz uma experiência no ano de 2009: pedi para uma agente de viagens cotar as despesas para assistir ao torneio na Costa do Sauípe e em Buenos Aires: este ficou mais barato e não tive dúvida, indo para lá assistir aos jogos. Ademais, apenas os hóspedes do resort podiam assistir aos jogos. As quadras ficavam às moscas. Segundo dizem, por praticamente coincidirem neste ano o torneio e o carnaval, aproveitou-se o pretexto para tirá-lo de lá e trazê-lo para São Paulo, pois

Mídia e Direito Penal

O título poderia ser outro: Mídia e Processo Penal. Ou: Mídia e Direito Constitucional. Ou: Mídia e direitos do acusado. O que tem intesse aqui, e que foi abordado quando se anunciou com estardalhaço o julgamento de Lindemberg, é que a mídia seria posta no banco dos réus para ser julgada por seus abusos. Não acredito que a advogada tivesse pensado em "compartilhar" a culpa de seu cliente, num arremedo grotesco da responsabilidade social de que falava um dos maiores representantes da Escola Positiva, Enrico Ferri, com a mídia. Ela não é letrada a tanto. Há muitos anos o brilhante penalista Nilo Batista escreveu um texto, e eu o indico aos alunos do 1° ano : "Mídia e Sistema Penal no capitalismo tardio". Ao final deste, colocarei o endereço em que ele pode ser acessado e lido. Nilo já havia, no ano de 1994, quando então governava o Rio de Janeiro (ele fora eleito vice e Brizola havia se afastado para se candidatar a presidente), na abertura do Congresso da Associaçã

Lindemberg

Charles A. Lindbergh foi um heroi estadunidense, assim considerado após realizar o primeiro voo solo entre o continente americano e o continente europeu sem escalas. Isso se deu no ano de 1.927. Casou-se com a filha de um senador. No ano de 1.932, um dos filhos do casal, Charles Jr. foi sequestrado e morto. O acusado, Bruno Hauptmann, foi processado e condenado à morte (embora alegando inocência até o último momento). Este trágico episódio é abordado de passagem no filme "J. Edgar"; como se sabe, foi John Edgar Hoover praticamente o criador do FBI e seu diretor por 48 anos. Foi um dos primeiros casos em que a polícia federal estadunidense teria atuado cientificamente na sua solução. Mas não é desse Lindbergh que eu quero falar - o que me daria extremo prazer, pois utilizo o caso da extorsão mediante sequestro ("kidnapping") de que foram vítimas ele e seu filho (Charles Sr. vítima da extorsão; Charles Jr. vítima do sequestro - a extorsão mediante sequestro é um deli

Indenizações

A coluna de Mônica Bergamo (FSP, E7) traz hoje uma notícia interessante, a seguir transcrita: Segurança Zero O Estado de SP terá que indenizar em 150 salários mínimos a família de Giovane Batista de Lima, morto aos 27 anos por um colega de cela, em 1999, na extinta Casa de Detenção do Carandiru. O Tribunal de Justiça acolheu recurso da Defensoria pedindo aumento da reparação, inicialmente de 50 salários. Lima teve várias perfurações, traumatismo craniano e hemorragia. QUEIJO SUÍÇO O Estado foi responsabilizado por não ter zelado pela integridade de um preso sob sua custódia nem impedido que armas brancas chegassem à cela. Caberia recurso da decisão, mas a Procuradoria Geral do Estado não pretende contestar. CASO RARO A condenação do Estado pela morte de um detento por colega de cela é excepcional. A maioria dos casos semelhantes refere-se à atuação da polícia no massacre do Carandiru, em 1992. Há também alguns questionamentos por omissão de socorro du

A estrangeira

         O premio Nobel de literatura Albert Camus escreveu um livro belíssimo, e amargo, muito amargo, chamado "O estrangeiro", e a personagem deste artigo nem estrangeira é: ela nasceu no Brasil, filha de pais franceses e morava na Suíça havia muitos anos. Não se trata, portanto, de plágio do título. Vinda ao Brasil em 1991 para o velório do pai, cujo corpo foi cremado, ela, que pretendia levar as cinzas para espalhá-las em Genève, na fronteira da Suíça com a França, viu-se envolvida em um episódio que lembra outro premiado autor, Fanz Kafka ("O processo", "Metamorfose", "Na colônia penal", entre outros).           Ela (vou chamá-la de Ana) chegou ao Aeroporto de Viracopos – nessa época era um aeroporto internacional de passageiros - para embarcar de volta à Suíça no mesmo momento em que, de maneira sub-reptícia, chegava um casal sul-americano, mas que somente a mulher tinha passagem aérea: o seu acompanhante já era um clandestino no própr

Politicamente correto

A atitude politicamente correta hoje pode, em alguns lances, ser comparada com a daquela pessoa que faz curso de enologia e depois passa a querer mostrar que é grande entendedora de vinho (foi apelidado de "enochato"). Ou de ex-fumante, que implica com qualquer fumaça perto de si. Essa atitude - equivocada - de "politicamente correto", além de mostrar-se como uma "caça às bruxas", aparenta muita vez ser uma reedição do macartismo (aportuguesamento do "McCarthysm", como alusão ao senador estadunidense Joseph McCarthy, que presidiu uma comissão que "caçava" comunistas, inclusive com incursões em Hollywood [vejam o filme "Majestic" para ter uma pálida ideia]). Alguém conhece o escultor Antônio Francisco Lisboa? Não? Ele é o famosíssimo "Aleijadinho" - e em breve não poderemos nos referir a ele por seu epíteto. Um dos maiores compositores de escola de samba do Rio tinha o apelido de "Beto Sem Braço" - por mot

Dia de branco

Durante a minha adolescência era comum dizermos no domingo à noite: “vamos embora que amanhã é dia de branco”. Ou: “segunda-feira é dia de branco”. Ninguém sabia o significado destas palavras, mas, para nós, significava que deveríamos nos recolher porque no dia seguinte trabalharíamos. Depois de quase 50 anos passados dessa época, e tendo em vista o que li num jornal local, resolvi pesquisar no Google o significado da expressão. Tudo parece fácil hoje: basta abrir o “site” de busca e digitar o que se pretende buscar. Pois bem, digitada a expressão, surgiram várias referências e a que me chamou a atenção foi a do Yahoo, em que é escolhida uma resposta dentre as várias ali postadas. Transcrevo algumas: 1. “É uma frase extremamente preconceituosa e racista, e que vem sido citada desde o início do século passado. Seria como dizer que os negros são vagabundos e só os brancos trabalham.”; 2. “ouvi dizer q na época de escravidão, sábado e domingo eram a folga dos negros na époc

A incendiária

        Cícera era uma nordestina, com o típico perfil de muitas mulheres brasileiras que eram atendidas pela Assistência Judiciária: separada, com dois filhos da união anterior e morando na periferia. Trabalhava como cozinheira num restaurante.         Juntou-se a um novo companheiro, que não tinha filhos. Ele também trabalhava, porém gostava de, ao sair do emprego, parar no bar para beber com os amigos; chegava em casa bêbado e por qualquer motivo, ou mesmo sem motivo, aplicava uma surra em Cícera, indo depois dormir (certamente, não era o sono dos justos).         Cansada dessa vida de “saco de pancada”, ela, num dia em que ele a tinha surrado mais uma vez,, esperou que o companheiro e agressor se deitasse e adormecesse, jogou sobre ele um litro de álcool e ateou fogo, fugindo a seguir com os filhos. O companheiro, em chamas, foi socorrido por vizinhos, sofrendo diversas queimaduras graves, principalmente na região do tórax e do abdôme, mas sobreviveu.         Cícera foi denuncia

CNJ etc

"Até as pedras sabem que as corregedorias não funcionam quando se trata de investogar os próprios pares." Esta frase foi dita em tom exaltado pelo ministro Gilmar Mendes quando do julgamento da manutenção ou cassação da medida cautelar ("liminar") concedida pelo ministro Marco Aurélio na ADI n° 4.638, ajuizada pela AMB. Quando Gilmar Mendes pronunciou a frase, em "off" ouvia-se a voz do relator, Marco Aurélio, mas não consegui ouvir corretamente o que ele dizia. Evidentemente, Gilmar Mendes não se referia apenas às corregedorias dos tribunais, mas sim a todas corregedorias, até as administrativas. Outra frase que entrará para a História foi pronunciada pelo ministro Joaquim Barbosa (que, por duas vezes, viveu situações de confronto, escapando da discussão jurídica, uma com Gilmar Mendes [quando este era presidente do STF], outra com Marco Aurélio): "As decisões do conselho passaram a expor situações escabrosas no seio do poder judiciário nacional&quo

CNJ

Outra questão palpitante e que tem tomado muita atenção das pessoas que são da área jurídica é a polêmica em torno dos poderes investigatórios do CNJ. Para fazer um breve resumo, o CNJ, órgão de controle externo do Poder Judiciário, foi criado pela Emenda Constitucional n° 45, de 30 de dezembro de 2004 e veio na esteira de uma famosa CPI intitulada "do Judiciário", que provocou muitas celeumas. Foi nesta CPI que foi apanhado o juiz Nicolau dos Santos Neto (conheci, pela lado de fora, da rua mesmo, o apartamento que ele comprou em Miami, próximo ao Bay Side: enorme). A criação de um órgão externo de controle era, ademais, anseio do grande parte do mundo jurídico, pois o controle que existia até então era somente interno. Criado o órgão, começaram as investigações e elas produziram sucesso (basta um acesso ao "site" para constatar o bom trabalho realizado; vou citar um: a partir de uma resolução por ele editada, foi dado um fim à "farra" das escutas telefô