Pular para o conteúdo principal

As várias mortes do prefeito - capítulo 68

-->

                       Uma sexta-feira, depois de cinco da tarde, na sede da PAJ estávamos eu e os seguranças somente. O dia fora como qualquer outro: plantão de atendimento de público no período da manhã, serviço interno no período da tarde. De repente, veio uma idéia: a filha de um empresário local, de nome Monique, havia sido sequestrada por “Valmirzinho” e poucos dias antes da morte do prefeito. Em casos desse tipo de crime, como é óbvio, os sequestradores fazem contatos – vários contatos – com os familiares para “negociar”[1] o valor do resgate e então a autoridade policial solicita ao Juiz de Direito autorização para monitorar o telefone que os sequestradores estão utilizando, bem como gravar as conversas. Era possível que “Valmirzinho” tivesse tido o seu aparelho monitorado.
                        Pensando nisso, fui ao fórum, diretamente ao cartório do distribuidor e ali solicitei informação de sobre distribuição de processo pelo nome da vítima, Monique. Havia um, sim, e distribuído à 4ª Vara Criminal. Anotei o número do processo e, com o coração já aos pinotes, fui ao cartório. Pedi o processo. A escrevente entregou-me. Tinha havido monitoramento telefônico. O pedido inicial feito pela autoridade policial do 4º Distrito fora denegado por falta de documentação. Renovado, e agora completo, foi deferido. Mais adiante estava toda a bilhetagem. Comecei a folheá-la. Meu ritmo cardíaco aumentou. Cheguei ao ponto: o aparelho celular que “Valmirzinho” estivera utilizando durante o sequestro da filha do empresário recebeu uma ligação de um telefone fixo na mesma noite da morte do prefeito, por volta de 22,32 horas – 17 minutos após os disparos, conforme a denúncia descrevia – na cidade de Caieiras, distante 77 km de Campinas. E mais: continuou o monitoramento – não se sabe porque – até cessarem as ligações com as mortes de “Valmirzinho” e “Anzo” (e mais duas pessoas) em Caraguatatuba. Anotei o número do telefone fixo fui embora para casa – passava das seis horas da tarde. A propósito: feliz da vida.




[1] . Quem faz a negociação pelo lado da família é sempre um policial do DEAS, treinado para isso, desde que a família solicite providências policiais

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A assessora exonerade

Um fato tomou a atenção de muitos a partir de domingo quando uma assessora “especial” do Ministério da Integração Racial ofendeu a torcida do São Paulo Futebol Clube e os paulistas em geral. Um breve resumo para quem não acompanhou a ocorrência: a final da Copa do Brasil seria – como foi – no Morumbi, em São Paulo. A Ministra da Integração Racial requisitou um jato da FAB para vir à capital na data do jogo, um domingo, a título de assinar um protocolo de intenções (ou coisa que o valha) sobre o combate ao racismo (há algum tempo escrevi um texto sobre o racismo nos estádios de futebol). Como se sabe, as repartições públicas não funcionam aos domingos, mas, enfim, foi decisão da ministra (confessadamente flamenguista). Acompanhando-a veio uma assessora especial de nome Marcelle Decothé da Silva (também flamenguista). Talvez a versão seja verdadeira – a assinatura do protocolo contra o racismo – pois é de todos sabido que há uma crescente preocupação com o racismo nos estádios de fu

Por dentro dos presídios – Cadeia do São Bernardo

      Tão logo formado em Ciências Jurídicas e Sociais e tendo obtido a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, prestei auxílio num projeto que estava sendo desenvolvido junto à Cadeia Pública de Campinas (esta unidade localizava-se na avenida João Batista Morato do Canto, n° 100, bairro São Bernardo – por sua localização, era apelidada “cadeião do São Bernardo”) pelo Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal (que cumulava a função de Corregedor da Polícia e dos Presídios), Roberto Telles Sampaio: era o ano de 1977. Segundo esse projeto, um casal “adotava” uma cela (no jargão carcerário, “xadrez”) e a provia de algumas necessidades mínimas, tais como, fornecimento de pasta de dentes e sabonetes. Aos sábados, defronte à catedral metropolitana de Campinas, era realizada uma feira de artesanato dos objetos fabricados pelos detentos. Uma das experiências foi uma forma de “saída temporária”.       Antes da inauguração, feita com pompa e circunstância, os presos provisórios eram “aco

Matando por amor

Ambas as envolvidas (na verdade eram três: havia um homem no enredo) eram prostitutas, ou seja, mercadejavam – era assim que se dizia antigamente – o próprio corpo, usando-o como fonte de renda. Exerciam “a mais antiga profissão do mundo” (embora não regulamentada até hoje) na zona do meretrício [1] no bairro Jardim Itatinga.             Logo que a minha família veio de mudança para Campinas, o que se deu no ano de 1964, a prostituição era exercida no bairro Taquaral, bem próximo da lagoa com o mesmo nome. Campinas praticamente terminava ali e o entorno da lagoa não era ainda urbanizado. As casas em que era praticada a prostituição, com a chegada de casas de família, foram obrigadas a imitar o bairro vermelho de Amsterdã:   colocar uma luz vermelha logo na entrada da casa para avisar que ali era um prostíbulo. Com a construção de mais casas, digamos, de família,   naquele bairro, houve uma tentativa de transferir os prostíbulos para outro bairro que se formava, mais adiante