Paulo Sergio Valle e Marcos Valle, dois
compositores daquele movimento que foi alcunhado “bossa nova”, compuseram uma
musica com o título deste texto e a primeira frase diz: “não confie em ninguém
com mais de 30 anos”. Como eu tenho bem mais de 30 anos – mais do que o dobro,
na verdade -, espero, contudo, que os leitores confiem no que eu vou escrever
nas “mal traçadas linhas” (conforme disse outro compositor – Erasmo Carlos)
abaixo.
Depois
da tragédia acontecida numa boate na cidade de Santa Maria, com 237 mortos,
dispararam as vistorias em casas noturnas em muitas cidades desta nosso “Brasil
varonil” – em Campinas, inclusive, como era de se esperar. Num ato insólito, e
até certo ponto deprimente, alguns nobre edis estavam se preparando para eles
mesmos, fugindo das suas funções – que não são muitas, diga-se -, fazerem
vistorias em casas noturnas. Como era ainda de se esperar, quase todas as casas
noturnas de Campinas foram flagradas funcionando irregularmente. O que leva
alguns empresários à tal conduta? O afã do lucro certamente é um dos motivos.
Sim, porque além de não oferecerem a segurança disposta em lei, tal como saídas
de emergência, extintores de incêndio e outras, sempre é permitida a frequência
em número superior ao cabível. Outro motivo é que o poder público – no caso
municipal – não fiscaliza conforme deveria, fazendo “vista grossa”. Meses atrás
publiquei neste espaço um texto abordando o mesmo tema, na época em que ocorreu
uma tragédia na praia em que vida de uma garotinha foi ceifada por um jet ski:
examinados esses aparelhos, constatou-se que mais da metade tinham alguma
irregularidade. Apenas a título de informação: o Corpo de Bombeiros de Campinas
“religiosamente” vistoria os prédios e disso sou testemunha: na vistoria do ano
passado, a administração do condomínio em que moro foi obrigada a afixar
cartazes indicando o número de cada andar e colocar alarmes para o caso de
incêndio. Eles não fazem “vista grossa”.
O
Brasil funciona assim: somente após uma catástrofe (anunciada, diga-se), em são
“parceiros” (para não dizer cúmplices) o poder público e os particulares é que
se resolve tomar alguma atitude.
E
aqui “na terrinha” surgiu o exemplo extremo: uma “casa noturna” que há 30 anos
funcionava sem alvará. Explicação: funcionava na zona do baixo meretrício onde
certamente os fiscais não comparecem para cumprir as funções inerentes ao seu
cargo. E essa casa tem uma história mais longa do que a ausência de alvará. Ela
foi objeto de uma contenda judicial envolvendo uma mulher que se dizia
proprietária e aquele que ostensivamente figurava como dono, com ingredientes
dignos de uma novela de televisão. Após retomar a “casa noturna” (naquela época
um prostíbulo disfarçado), a sua proprietária, que tinha o “nome de guerra”
Sonia, foi morta por um garçom: ela tinha sofrido uma cirurgia na garganta e
estava em repouso, na cama, sem poder falar e o garçom esfaqueou-a. Preso, confessou ter agido a mando daquele que havia sido destituído da
posse, de nome Ênio. Ambos foram julgados em julgamentos separados e condenados:
Ênio foi condenado a 14 anos de reclusão (assisti ao julgamento: o seu defensor
foi um dos maiores tribunos do júri, Waldir Troncoso Peres). Estando preso,
Ênio, alegando doença, foi levado ao Hospital Irmãos Penteado, com escolta na
porta, mas conseguiu fugir, nunca mais sendo preso: a sua punibilidade foi
extinta pela prescrição. Dizem que ele montou uma casa noturna no distrito de Sousas, mas esta é outra história.
Pois
é: a história dessa “casa noturna” não se resume ao recorde de 30 anos sem
vistoria e funcionamento irregular.
Fotos das providências exigidas na vistoria do Corpo de Bombeiros.
Comentários
Postar um comentário