Pular para o conteúdo principal

As várias mortes do prefeito (capítulo 29)

 
                        Aos 28 de novembro, a Ordem dos Advogados do Brasil, Subseção de Campinas, por sua presidência, apresentou longa petição, em que, após discorrer sobre o fato, requereu à Juíza de Direito da 1ª Vara Criminal, que: a] fosse determinado ao Delegado Seccional de Polícia que colocasse “incontinenti” os autos de inquérito à disposição dos advogados de todos os presos (a prisão temporária havia sido prorrogada); b] fossem os autos “disponibilizados” à presidente da Comissão de Direitos Humanos da subsecção de Campinas; c] fosse “quebrado”, “incontinenti”, o sigilo que havia sido decretado. O Ministério Público, como era de se esperar, opinou pelo indeferimento dos pedidos: todos foram indeferidos, no dia 21 de dezembro.
                        Antes do indeferimento, fatos inusitados ocorreram. Assim é que aos 5 de dezembro, pelo Juiz da Vara das Execuções Criminais de Campinas, foi ouvida uma pessoa que estava presa e cujo nome, bem como a penitenciária, o raio e a cela em que estava, foram omitidos “em virtude de temer por sua integridade física e moral”. Estava acompanhado de advogado, cujo nome também foi omitido. Disse que “quatro criminosos tinham a pretensão de seqüestrar o Sr. Prefeito de Campinas, objetivando uma extorsão. Para inicial a empreitada criminosa, foi roubado um veículo Vectra no bairro Pe. Anchieta; acredito que o referido roubo ocorreu um dia antes da morte do Sr. Prefeito. Este roubo foi praticado por um menor de idade e por Anderson dos Santos Amorim. Esclarece que desconheço o nome do menor. Anderson está preso na cadeia pública de Santa Bárbara D’Oeste, com procedência da cidade de Sumaré”. E mais adiante: “uma pessoa ligada ao Sr. Prefeito e que trabalha na Prefeitura Municipal de Campinas teria passado aos seqüestradores que o Sr. Prefeito mantinha em sua residência, mais precisamente em um cofre, a importância de 300 mil reais, dinheiro esse que seria usado na campanha eleitoral de 2002. Os seqüestradores pretendiam seqüestrar o Sr. Prefeito para extorquir os 300 mil reais. Esta pessoa ligada ao Sr. Prefeito passou aos seqüestradores o itinerário do Sr. Prefeito no dia do crime”. E acrescentou: “no interior do Vectra estavam Anderson dos Santos Amorim, Márcio (não sei o sobrenome nem se tem algum apelido) e uma outra pessoa, que desconheço o nome. Quem estava na condução do Vectra era o seqüestrador Anderson dos Santos Amorim. A informação que tenho é que Márcio é uma pessoa de porte físico médio e da raça japonesa. Também tenho conhecimento de que Márcio atualmente está escondido na cidade de Porto Soares, Bolívia. O Prefeito Municipal ao ser abordado levou as duas mãos até a peça que solta o cinto de segurança. Este movimento assustou os seqüestradores e, em razão disso, um dos seqüestradores disparou na direção da vítima”. Esclareceu que “um quarto seqüestrador de nome Paulo estava no cativeiro, o qual se situava no município de Atibaia”. Afirmou que Paulo, vulgo “Paulinho”, estava escondido na cidade de Monte Alegre do Sul. Descreveu o local do cativeiro: “a chácara tinha acesso pela Rod. D. Pedro e ao passar debaixo do retorno se andava por volta de 700 a 1.000 metros estrada até chegar na sede da sociedade”. Disse que a arma foi jogada “em um rio, na cidade de Jaguariúna”[1].
                        Esta pode ser apontada como a terceira versão para a morte do prefeito.

 (Capítulo do livro "As varias mortes do prefeito", a ser publicado, que descreve o processo que apurou a morte do prefeito Antonio Costa Santos, de Campinas.)


                       


[1] . Foi encontrada uma arma de fogo calibre 9mm na entrada de Jaguariúna; não era, todavia, a arma de onde saiu o projétil que vitimou o prefeiro

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A assessora exonerade

Um fato tomou a atenção de muitos a partir de domingo quando uma assessora “especial” do Ministério da Integração Racial ofendeu a torcida do São Paulo Futebol Clube e os paulistas em geral. Um breve resumo para quem não acompanhou a ocorrência: a final da Copa do Brasil seria – como foi – no Morumbi, em São Paulo. A Ministra da Integração Racial requisitou um jato da FAB para vir à capital na data do jogo, um domingo, a título de assinar um protocolo de intenções (ou coisa que o valha) sobre o combate ao racismo (há algum tempo escrevi um texto sobre o racismo nos estádios de futebol). Como se sabe, as repartições públicas não funcionam aos domingos, mas, enfim, foi decisão da ministra (confessadamente flamenguista). Acompanhando-a veio uma assessora especial de nome Marcelle Decothé da Silva (também flamenguista). Talvez a versão seja verdadeira – a assinatura do protocolo contra o racismo – pois é de todos sabido que há uma crescente preocupação com o racismo nos estádios de fu

Por dentro dos presídios – Cadeia do São Bernardo

      Tão logo formado em Ciências Jurídicas e Sociais e tendo obtido a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, prestei auxílio num projeto que estava sendo desenvolvido junto à Cadeia Pública de Campinas (esta unidade localizava-se na avenida João Batista Morato do Canto, n° 100, bairro São Bernardo – por sua localização, era apelidada “cadeião do São Bernardo”) pelo Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal (que cumulava a função de Corregedor da Polícia e dos Presídios), Roberto Telles Sampaio: era o ano de 1977. Segundo esse projeto, um casal “adotava” uma cela (no jargão carcerário, “xadrez”) e a provia de algumas necessidades mínimas, tais como, fornecimento de pasta de dentes e sabonetes. Aos sábados, defronte à catedral metropolitana de Campinas, era realizada uma feira de artesanato dos objetos fabricados pelos detentos. Uma das experiências foi uma forma de “saída temporária”.       Antes da inauguração, feita com pompa e circunstância, os presos provisórios eram “aco

Matando por amor

Ambas as envolvidas (na verdade eram três: havia um homem no enredo) eram prostitutas, ou seja, mercadejavam – era assim que se dizia antigamente – o próprio corpo, usando-o como fonte de renda. Exerciam “a mais antiga profissão do mundo” (embora não regulamentada até hoje) na zona do meretrício [1] no bairro Jardim Itatinga.             Logo que a minha família veio de mudança para Campinas, o que se deu no ano de 1964, a prostituição era exercida no bairro Taquaral, bem próximo da lagoa com o mesmo nome. Campinas praticamente terminava ali e o entorno da lagoa não era ainda urbanizado. As casas em que era praticada a prostituição, com a chegada de casas de família, foram obrigadas a imitar o bairro vermelho de Amsterdã:   colocar uma luz vermelha logo na entrada da casa para avisar que ali era um prostíbulo. Com a construção de mais casas, digamos, de família,   naquele bairro, houve uma tentativa de transferir os prostíbulos para outro bairro que se formava, mais adiante