Corria
o ano de 2008 quando fui procurado por uma pessoa que eu conhecia havia tempos,
funcionário de um universidade estadual, que queria que eu assumisse a defesa
de um dos seus filhos - ele estava preso, acusado de integrar uma quadrilha que
praticava furtos em caixas eletrônicos. A prisão, inicialmente temporária,
depois preventiva, fora decretada no inquérito (e depois processo) em que era
apurado o crime de quadrilha. Inteirei-me do conteúdo do feito e assumi a
defesa. Havia escuta telefônica (naquela época, a escuta era uma autêntica
“farra”: com uma fundamentação frágil era decretada a escuta e depois prorrogada
“ad aeternum”, o que levou o CNJ, presidido então pelo ministro Gilmar Mendes,
a formular regras para a autorização judicial às escutas).
A
sua prisão fora decretada no feito em que apurava o crime de quadrilha e foram
instaurados mais 3 inquéritos para apurar os furtos qualificados. Nestes, o que
mais me prendeu a atenção foi que a prova da materialidade do fato era feita
por testemunhas, por vezes um terceirizado que prestava serviço à instituição bancária.
O furto, como se sabe. É doutrinariamente classificado como material, ou seja,
é daquelas infrações penais em que há um distanciamento lógico e cronológico
entre a conduta e o resultado (nessa classificação, ou outros são os formais
[também chamados de crimes de consumação antecipada] e os de mera conduta.
Se
qualquer um de nós, mortais, sacar míseros 10 reais de nossa conta corrente num
caixa eletrônico, além do recibo referente ao saque, tal operação será
infalivelmente registrada no extrato que nos é enviado mensalmente. Quando a
polícia solicitava ao banco informação sobre o quanto havia sido subtraído do
caixa eletrônico, a instituição enviava um seu representante, geralmente “encarregado
da segurança”, que, em depoimento, afirmava que havia sido levada a quantia de R$61.542,00.
Não era apresentado um documento sequer a demonstrar a quantia do prejuízo, e,
pois, a materialidade do delito.
Num
dos primeiros processos que foram julgados, o magistrado absolveu o suposto
ladrão – o mesmo que eu defendia – exatamente com este fundamento: ausência de
prova da materialidade do furto qualificado. Por motivos que não vêm ao caso,
renunciei e não pude saber se nos outros processos a solução foi a mesma, que,
a meu ver, era a correta no caso.
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