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Mostrando postagens de 2015

O gordinho e a manicure

        Tudo estava correndo às mil maravilhas: teriam (mais?) um encontro romântico-sexual num motel. O local não era lá essas coisas, porém foi o que de melhor conseguiram: afinal tratava-se de um encontro às escondidas, fruto de uma traição, mas o importante é que eles teriam uma tarde de prazer. As paredes externas do motel são emboloradas. Pode? Algo os ligava além da atração: eram (quase) parentes. O parceiro na aventura tinha um pequeno sobrepeso: um gordinho...       O casamento dela não estava em crise, como alguém mal informado pudesse pensar, não: as fotos postadas nas redes sociais mostravam o oposto. Uma delas mostrava a mulher, ela, de biquíni, grávida, com o esposo ao lado na clássica pose: passando a mão sobre o barrigão, sentindo “os chutes” do feto?       Para que ninguém pudesse desconfiar de algo, a mulher, que era gerente de uma agência de um banco internacional, atuando em todos os países, postou no WhatsApp que estava indo à manicure (“indo fazer as un

Uma noite (de terror) em Paris - III

      O grupo terrorista VAR-Palmares detonou um carro-bomba no Quartel General do II Exército, no Ibirapuera, matando um dos soldados que estavam de sentinela, Mário Kozel Filho; por conta disso, foram os soldados da 1ª Companhia do 1° Batalhão de Carros de Combate Leves, localizado em Campinas, convocados para ir a São Paulo, pois as autoridades militares acreditavam que outros ataques seriam perpetrados.       Colegas de farda foram me buscar em casa de madrugada para me levar ao quartel a fim de receber as ordens. Na noite da véspera, eu tinha ido com alguns amigos a uma festa junina e no caminho presenciamos um acidente de trânsito: na rua atrás do Liceu Nossa Senhora Auxiliadora, uma Kombi invadiu a contramão e abalroou uma lambreta, atingindo a perna do carona. Foram os dois ao chão e a perna do carona dobrou-se para trás como em um desenho animado. Ele urrava de dor. Tocamos a campainha de uma casa ali próxima e pedimos ao dono que chamasse a polícia e o socorro (este se

Uma noite (de terror) em Paris - II

      Muitas pessoas perguntam se foi muito assustadora a noite de 13 de novembro de 2015 quando estávamos em Paris; outras, diferentemente, já vão perguntando sobre o tamanho do susto que tomamos quando ocorreram os ataques. Ou dizem logo: "que susto, hein"?       Na realidade, não foi muito assustador, pelo menos para mim; minha mulher, assustou-se bastante. Por alguns motivos, não tive medo. Um deles é que, quando tomamos conhecimento dos ataques, eles já haviam acontecido e quando aconteceram estávamos no meio de um jantar num restaurante ao lado da Catedral de Notre Dame, saboreando a autêntica cozinha francesa. Embora eles tivessem terminado, sobra sempre um receio, pois esses ataques covardes são imprevisíveis: bombas de tempo colocadas em carros estacionados na via pública, outras tantas colocadas em lixeiras, como, aliás, já aconteceu.       Em segundo lugar, o barulho das sirenes – de carros policiais, dos bombeiros, resgate – que cortavam a cidade perdurar

Uma noite (de terror) em Paris

       Era a terceira vez que iríamos à “cidade luz” e desta vez por nós mesmos. É que as anteriores fomos em grupo por empresa de turismo e nessas oportunidades nem todas as grandes atrações são visitadas. De qualquer forma, já conhecíamos a Torre Eiffel, o Arco do Triunfo, o Museu do Louvre, Montmartre, Invalides (sem entrar, porém), passeio de “bateaux” pelo rio Sena, Galerias Lafayette. Não tínhamos conhecido o Opera, as Galerias Printemps, o Museu D’Orsay, entre outros. Mas desta vez iríamos a esses e a outros locais, e, quem sabe, rever um (ou uns) daqueles outros.       A viagem, fugindo ao nosso padrão, foi preparada muito antes da partida (por muito antes entenda-se uns quatro meses) e o hotel foi escolhido a dedo: no coração de Paris, na avenida Victoria, distante dois quarteirões do Louvre e a um quarteirão do Sena. Por coincidência, ao receber o e-mail de confirmação da reserva, ele estava escrito em português, com a surpresa adicional de que o “staff” falava a noss

A testemunha míope

            Era uma modorrenta tarde de sábado; mais precisamente, anoitecia. Ali no início da rua Paula Bueno, ele, um egresso do sistema carcerário, onde entrara e saíra por algumas vezes, sempre debaixo da mesma acusação: crime contra o patrimônio. Ele perambulou por ali, examinando as modestas casas para ver se alguma estava vazia. Bingo: escolhida uma, ele pulou o muro baixo (naquele tempo as casas ainda tinham muros baixos, sem nada de grade ponta de lança ou cerca eletrificada), foi ao quintal e iniciou o arrombamento da porta da cozinha.       Porém, desde o momento em que ele se encontrava em atos de cogitação (a execução do crime compõe-se de cogitação [impunível], preparação [em geral, impunível] e execução, podendo atingir a consumação foi estacar-se na tentativa), ele não sabia, mas estava sendo observado por uma moradora da casa em frente (naquele local, há uma bifurcação, em que as ruas são separadas por um pequeno jardim), cuja casa fica num plano mais alto