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Fuga em massa frustrada


 
                        Naquele tempo eu coordenava o serviço de assistência jurídica nos presídios da região (entenda-se: Campinas) e eles eram os seguintes: Penitenciária I, Penitenciária II, Presídio (semiaberto) Ataliba Nogueira, Centro de Detenção Provisória de Campinas, Centro de Detenção Provisória de Hortolândia e Casa de Detenção Campinas-Sumaré. Vários detentos deste último estabelecimento carcerário pretenderam empreender fuga em massa e para tanto escalaram os muros e ganharam a parte externa do presídio. Não conseguiram ir longe: foram alcançados pelos agentes de segurança penitenciária e por policiais militares e ali mesmo agredidos. Coronhadas, pancadas com paus e até tiros; muitos ficaram feridos. Depois de recapturados, seriam transferidos para outros presídios e enquanto a transferência não se ultimava, eles foram encaminhados ao um dos centros de detenção provisória, para “despistar” a violência de que foram vítimas. Para acautelar-se, porém, o diretor do CDP resolveu ouvir todos em declarações e fui chamado para acompanhar os depoimentos desses detentos. Eles realmente haviam sido espancados e feridos: um havia sido atingido por projétil de arma de fogo no braço; outros ostentavam ferimentos próprios de quem havia sido atingido por um pedaço de pau.
                        Tão logo se encerraram os depoimentos, incontinenti dirigi-me à Procuradoria Regional de Campinas e  preparei um pedido endereçado à Juíza da Vara de Execuções Criminais para que fosse instaurado procedimento tendente a apurar a responsabilidade pelo espancamento, bem como que fosse obstada a  transferência daqueles detento e, ademais, que eles fossem submetidos a exame de corpo de delito. Meu requerimento foi deferido. Porém, antes de que tudo se ultimasse, por razões que agora não vêm ao caso, requeri a minha saída do cargo de coordenador, que, a custo, foi deferida, o que me impediu de saber o resultado. O que deve ficar registrado é que, embora tenha presenciado as declarações dos “fujões”, bem como visto os ferimentos, e, além disso, peticionado requerendo providências, nunca fui chamado para ser ouvido.  

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