Está
em todos os meios de comunicação: dois brasileiros foram condenados no Brasil
por homicídio que cometeram no Japão. Cristiano Ito, atualmente com 39 anos, e
Marcelo Chrystian Gomes Fukuda, com 36, a mando da “máfia” japonesa Yakuza,
mataram, no ano de 2001, um comerciante de nome Yoshikata Kawakami, a mando do
irmão deste. Pensavam que o comerciante estava sozinho, mas ele estava com a
mulher, Naomi Kawakami: ao ver que ela estava ali, quiseram matá-la por asfixia
e ela se fingiu de morta; sobreviveu, porém. Deixaram o local e dois dias
depois, com a ajuda da “máfia”, embarcaram para o Brasil. O mandante do
homicídio, julgado no Japão, foi condenado a prisão perpétua. Os fatos
ocorreram em Tóquio.
Em
2011 os dois brasileiros – que, desnecessário seria dizer, são descendentes de
japoneses – foram presos e no dia 7 de dezembro de 2016 levados a julgamento em
São Paulo, pelos crime se homicídio qualificado consumado e homicídio qualificado
tentado. Tendo sido ambos condenados: Cristiano a 22 anos e 1 mês de reclusão,
e Marcelo a 23 anos e 7 meses. O advogado de ambos declarou à imprensa que não
recorrerá já que considerou as penas “justas”. Para cometer esse “crime de
mando”, cada qual recebeu três milhões de ienes cada um – na época, equivaliam
a setenta mil reais.
O
tema é interessante: como é que dois brasileiros foram julgados (e condenados)
no Brasil por um crime cometido no Japão? A resposta é muito simples e pode ser
desdobrada em dois itens.
EXTRADIÇÃO – Há uma regra básica em
Direito Penal: considera-se praticado o crime no local em que ele se consumou e
ao fato a lei do país. Isto tem a ver com a soberania dos países (Estados) que
têm a primazia de aplicar a sua lei penal nos limites de seus territórios. O
Brasil, por exemplo, aplica as leis penais no território brasileiro. Não
importa a nacionalidade da pessoa que cometer o crime no território brasileiro
(e aqui há extensão do território, compreendendo os barcos e aviões oficiais
brasileiros, por exemplo): ela sempre será julgada segundo a lei brasileira. Se
o autor do fato fugir para outro país (território), o Brasil requererá a ele a
extradição do criminoso. Caso exista tratado de extradição, melhor; caso não
exista, basta que haja uma promessa de reciprocidade em caso semelhante no
futuro. Mas há um problema: em geral, os países não extraditam os nacionais e
esse é o caminho que segue o Brasil. Por imposição constitucional (artigo 5°,
inciso LI, da Constituição), o Brasil não extradita brasileiro nato (que nasceu
no Brasil) e os naturalizados somente na prática de crime comum praticado antes
da naturalização ou “de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, na forma da lei”. Portanto, embora eles sejam
descendentes de japoneses, são brasileiros e jamais seriam extraditados; porém,
seriam julgados no Brasil conforme a lei penal brasileira, o que, para ambos,
poderá constituir-se em vantagem.
LEI PENAL NO ESPAÇO – Conforme escrito
linhas acima, o Código Penal, no artigo 6°, considera “praticado o crime no
lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se
produziu ou deveria produzir o resultado”. Apenas para registrar, o homicídio é
um crime de resultado, ou seja, da ação (ou omissão) decorre um resultado – no
caso, a morte. Porém, a morte a mando da máfia ocorreu no Japão e não no Brasil
e para esta hipótese aplica-se o artigo 7° (extraterritorialidade), em que está
escrito que “ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no
estrangeiro... (inciso II) ... os crimes ... (b) praticados por brasileiros”.
Todavia, existem condições para que a lei penal seja aplicada ao brasileiro
pelo crime cometido no estrangeiro. São elas: (a) entrar o agente no território
nacional; (b) ser o fato punível também no país em que foi cometido: (c) estar
o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a
extradição; (d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí
cumprido a pena; (e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro, ou, por
outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
Todos esses requisitos estavam presentes e então foram eles julgados segundo a
lei brasileira.
Assinalei
que o fato de ser aplicada a lei penal brasileira (e jamais se aplica a lei do
país em que o brasileiro cometeu o crime) poderia ser benéfico aos réus e foi:
aqui não existe a prisão perpétua, o que não se dá no Japão, que a prevê, e ao
mandante do crime – lembrando, irmão da vítima – foi imposta essa pena. Segundo
o Código Penal brasileiro, a pena prevista ao homicídio qualificado é a de
reclusão, de 12 a 30 anos.
Como
se vê, a explicação é simples.
Muito bom o artigo.
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