Um
desses casos, e que, por suas nuances, ficou gravado na minha memória foi o de
um réu que tinha nome de apóstolo, João Batista[1],
contra quem pesava a acusação de haver matado, com diversos golpes de faca, a
sua mulher, com qual tinha uma filha. Ele nunca negou o (hoje) feminicídio, porém
alegava que assim havia agido porque era traído (disse a professora Mariza
Correa, num belíssimo livro por si escrito (“Morte em família”) que a simples
suspeita servia para que a esposa fosse morta e por vezes essa mesma suspeita
servia de base aos jurados para absolver o acusado. Ele foi condenado e
batalhei em segunda e terceira instâncias ao menos para abrandar-lhe a pena,
infrutiferamente.
Depois
de muito tempo, com as festas natalinas se aproximando, fui cumprir um plantão
no Juizado Especial Cível (nos acompanhávamos as audiências que envolviam
litigantes sem condições de pagar um profissional. Como não havia necessidade
de que eu ali permanecesse, já estava me retirando quando fui abordado por uma
pessoa que me chamou pelo nome. Olhei-a mas não a reconheci e prontamente disse
a ela, ao que ela respondeu: “sou o João Batista, lembra?”.
Conseguindo
lembrar, perguntei: “aquele que matou a mulher a facadas na rua Culto à Ciência”?
A resposta foi afirmativa. Curioso, perguntei o que ele estava fazendo ali no fórum,
mais especificamente no Juizado Especial Cível. Ele contou que trabalhava com
semi-jóias que o seu negócio estava indo de vento em popa: queria mostrar
algumas, já que na pasta que portava havia um mostruário, mas, alegando
qualquer desculpa que hoje não lembro, desinteressei-me. Mas o motivo que o
levava ali era que um freguês havia comprado uma razoável quantidade de peças e
não havia honrado o pagamento, ou seja, dera um “calote”.
Pela
forma civilizada escolhida para fazer a cobrança – as vias judiciais – e não as
agressivas, com uma faca, por exemplo, percebi que a pena que cumpriu uma das
suas finalidades, qual seja, a reeducação. Ao lhe dizer que estava indo para a
PAJ, que ficava a dois quarteirões do Palácio da Justiça, ele me acompanhou e
ali fez algumas vendas para as funcionárias, com o pagamento parcelado. Em tom
de chiste informei-as que ele era viúvo, porém não contei o motivo da morte da
mulher.
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