Esse
vocábulo estranho passou a ocupar as manchetes dos meios de
comunicação para noticiar um tipo de crime: a morte de uma mulher.
A
morte de um ser humano provocada por outro ser humano existe desde sempre: para os criacionistas, ela está na Bíblia,
sob a forma de fratricídio (morte de um irmão – Caim e Abel). E a punição da
morte de um homem praticada por outro homem é punida desde sempre, muitas vezes
com penas atrozes – suplícios -, muitas vezes com a morte do matador. Nas legislações antigas era comum
encontrar-se diferença de punição segundo a condição social tanto do sujeito
ativo (matador) quanto do sujeito ativo (vítima). Como exemplo, pode ser citada
a legislação brasileira antiga, em que a morte de um escravo não era
considerada homicídio: como o escravo era considerado “coisa”, o seu
proprietário que era vítima e de um crime de dano.
O
Código Penal brasileiro pune a morte no artigo 121, sob o nome de “homicídio”[1],
com a seguinte dicção: “matar alguém”. Para esclarecer o que se deve entender
por “alguém”, o presidente da Comissão Revisora definiu que era “o ser vivo,
nascido de mulher”. Ou seja: qualquer pessoa, não importando, o sexo, a
condição social ou a condição de saúde. Um doente terminal que seja morto é
vítima do crime em questão. O mesmo pode se dizer que um condenado à morte que
seja morto quando está sendo levado ao cadafalso. Embora a essas pessoas
resulte, por assim dizer, poucas horas de vida, elas continuam a merecer a proteção
penal.
O
homicídio divide-se em simples, qualificado e privilegiado. Ao homicídio
simples é fixada a pena de reclusão, de 6 a 20 anos; ao qualificado, a pena
continua sendo a de reclusão, porém de 12 a 30 anos; já o homicídio
privilegiado consiste numa causa de redução da pena.
Matar
uma mulher era punido da mesma forma como se tivesse matado um homem, ou seja,
a pena era a mesma: ambos eram seres humanos, ambos eram pessoas. Havia sutis
diferenças, como por exemplo, quando a mulher estava grávida e o sujeito ativo
sabia desse estado. No caso, tratava-se somente de circunstância agravante
genérica, ou seja, a pena era agravada, respeitado o limite máximo previsto
para o crime (dizem os penalistas que uma circunstância agravante não pode
elevar a pena acima do máximo previsto em lei).
Como
o Direito, principalmente o Direito Penal, acompanha a evolução da sociedade,
passando a proteger valores que até então não gozavam dessa proteção (diz o
autor da Teoria Tridimensional do Direito [Miguel Reale] que a lei surge do
atrito entre o fato e o valor), surgiu em primeiro lugar a Lei Maria da Penha,
e, em sequência, o feminicídio. A lei penal que criou essa modalidade delituosa
foi a de número 13.104, de 9 de março de 2015, tornando uma qualificadora (e
não um tipo penal novo e autônomo) o homicídio praticado contra mulher “por
razões da condição de sexo feminino”, conforme se lê no inciso VI do parágrafo
2° do artigo 121. O mesmo parágrafo, acrescido da letra A, esclarece o que se
deve entender pela frase “por razões da condição de sexo feminino”- “considera-se
que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: I –
violência doméstica ou familiar; II – menosprezo ou discriminação à condição de
mulher”.
A
lei 13.104/15, ademais, trouxe consigo causas de aumento da pena (de 1/3 até a
metade) no crime de feminicídio quando for cometido: I – durante a gestação ou
nos 3 (três) meses após o parto; II – contra pessoa menor de 14 anos, maior de
60 ou com deficiência; III – na presença de descendente ou ascendente da
vítima.
Essa
é uma ligeira abordagem do feminicídio.
[1] .
Homicídio, segundo alguns, deriva de “hominis occidium”, para outros, de
“hominis excidium”. Na língua portuguesa, especialmente no Brasil, há um
vocábulo que pode militar em favor da primeira opinião: ocisão, que significa
ação de matar, assassínio.
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