Ele um padre e creio que
daquelas ordens que fazem voto de pobreza: não usava hábito (ou batina), o que
iguala todos, mas sim roupas comuns e muito humildes. Era, conforme devem ser
todos os religiosos, muito afável. O seu carro era um Fusca bem usado, que
servia para percorrer as ruas da paróquia onde atuava. Um dia, por infortúnio,
atropelou um ciclista, causando-lhe ferimentos leves. A princípio, se fosse acusado,
seria de lesões corporais (leves)[1]
culposas e o inquérito tramitou pelo 4º Distrito Policial, pois o fato ocorreu
no bairro Taquaral.
Fiz o acompanhamento do
inquérito, indo com ele até o distrito policial quando ele seria – e foi –
ouvido pelo Delegado de Polícia. Tudo o que foi amealhado durante a tramitação
do inquérito policial demonstrou que a responsabilidade fora exclusiva do
ciclista, ou seja, que este havia “atropelado” o carro do religioso, o que fez
com que o Ministério Público requeresse o arquivamento, pleito prontamente
atendido pelo Juiz de Direito.
Não cobrei honorários,
óbvio, atuando “pro bono”; porém, como gratidão[2]
ele me deu um presente: uma garrafa de vinho daqueles que são utilizados na
missa. Talvez nem os mais experientes enólogos fossem capaz de conhecer o vinho
pela marca; acredito que ele fosse fabricado apenas para o consumo durante a
missa, ou seja, em pouquíssima quantidade. Pareceu-me ser uma zurrapa.
Confesso que não o
tomei: meu gosto é por cerveja.
[1] .
Não há, nas lesões corporais culposas, a divisão entre leves, graves,
gravíssimas e seguidas de morte (esta divisão é feita pela doutrina; no Código,
a divisão entre as lesões dolosas é esta: leves, graves e seguidas de morte).
[2].
Segundo Kant, “a gratidão consiste em honrar uma pessoa devido a um benefício
que ela nos concedeu”. (“Metafísica dos costumes”, Folha de São Paulo, 2010,
página 201.
Comentários
Postar um comentário