Estourou
como uma bomba na mídia e nas “redes sociais”: o consagrado ator de novelas da
Globo, José Mayer, teria praticado o crime de assédio sexual contra uma figurinista
da mesma emissora. Como sói acontecer em casos que tais, um batalhão de pessoas
fez protestos contra a conduta do ator e este, muito timidamente, admitiu que
errou. Depois deste episódio envolvendo a figurinista, outras mulheres, uma
delas atriz de nomeada, apresentaram-se em público afirmando que elas também
foram por ele assediadas. A imprensa noticiou à exaustão.
Segundo
o consagrado escritor Oscar Wilde[1],
“a vida imita a arte e não o contrário”: o ator viveu papéis em novelas retratando
conquistadores e, desta vez, na vida real, quis reencarnar um deles e deu-se
mal.
O
crime de assédio sexual foi introduzido na legislação penal brasileira, mais especificamente
no Código Penal, pela Lei n° 10.224, do ano de 2001, tomando o número 216-A (o
artigo 216 do Código Penal definia e punia o crime de atentado ao pudor
mediante e foi revogado pela Lei n° 12.015, do ano de 2009). Um renomado
doutrinador brasileiro disse que a criação desse novel tipo penal foi uma cópia
do que existia em outras legislações, especialmente a norte-americana. Se foi
uma cópia, foi malfeita.
É
certo que por aquela época grassava uma onda de indignação contra essa atitude
masculina de “assediar” mulheres, ocasião em que em alguns países do mundo
houve um retrocesso: o elevador, que então era comandado
pelo próprio usuário, passou a ter ascensorista para evitar que um passageiro "assediasse" outro.
O doutrinador brasileiro que afirma que a lei era cópia (e eu digo: malfeita)
cita como exemplo um filme realizado sete anos antes da lei e o assédio era de
uma mulher contra um homem: Assédio Sexual (“Disclosure”, estrelado por Demi
Moore e Michael Douglas). Esse filme foi baseado num livro de Michael Crichton
que, entre outros, escreveu Parque dos Dinossauros.
A
definição existente no artigo 216-A é esta: “constranger alguém com o intuito
de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua
condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de
emprego, cargo ou função”. A pena prevista é de 1 a 2 anos de detenção. Como se pode ver e ao contrário do que se imagina, o verbo do tipo não "assediar" e sim "constranger". Como o
próprio autor admitiu, ele praticou uma conduta que, por assim dizer, “assediou”
a figurinista. Mas somente isso, embora confessadamente, não serve para
caracterizar a descrição prevista no tipo, ficando faltando elementos
essenciais.
O
verbo do tipo é “constranger” e os intérpretes da lei penal em uníssono dizem
que ele tem o significado de “forçar alguém a fazer alguma ou tolher seus
movimentos”[2] . Aqui já fica demonstrada como a cópia foi
malfeita. Esse mesmo verbo (“constranger”) está em outros tipos penais, alguns
considerados violentos, como, por exemplo a extorsão (no Brasil conhecido por “chantagem”).
Ademais, a descrição do artigo 216-A exige que o sujeito ativo (agente) prevaleça-se
“da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício
de emprego, cargo ou função”. Cargo ou
função são situações, assim como a hierarquia, exclusivas da Administração
Pública. Além disso, a ascendência deve referir-se a um contrato entre o
sujeito ativo e o sujeito passivo, ou seja, entre eles deve existir uma relação
laboratícia. Ao que consta, eles eram colegas de trabalho, não existindo
ascendência entre o ator e a figurinista.
Por
todos os lados que se analise o fato, é forçoso concluir que houve “um assédio” mas
nunca “sexual”, ou seja, não se realizou o tipo penal de "assédio sexual".
Talvez
ele tenha cometido uma contravenção penal chamada “importunação ofensiva do
pudor”, assim descrita na lei respectiva (artigo 61): “importunar alguém, em lugar
público ou aberto ao público, de modo ofensivo ao pudor”. Mas este é outro assunto.
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