Pular para o conteúdo principal

Brigas de torcidas




      Brasil, o país do futebol! Todo brasileiro deve ter ouvido essa frase um número incontável de vezes. A ela deve ser acrescentada outra: e das brigas entre torcidas também. Torcidas organizadas principalmente.
      Alguns países já passaram por este malefício antes, podendo ser citado como exemplo os “holligans”, da Grã Bretanha e os “barrabravas” da Argentina. Esse período maléfico foi razoavelmente superado – e no Brasil parece que eles estão crescendo.
      Tive a oportunidade de atuar na defesa de um corintiano, que pertencia à torcida organizada chamada “pavilhão nove”, que foi acusado de alguns crimes (lesão corporal, dano, associação criminosa e mais um delito, o previsto no artigo 41B do Estatuto do Torcedor). Não foi uma briga como as comuns, em que as torcidas ou mesmo as alas de uma torcida combinam um encontro para se digladiarem. Foi praticamente um encontro fortuito.
      Um caminhão baú transportava alguns torcedores corintianos, dentre os quais o que eu defendi, que ali estava fortuitamente, pois não fazia parte do grupo, indo apenas de carona até a Rodoviária, quando, ao parar num semáforo, um carro emparelhou e dentro deste veículo estavam três palmeirenses, que começar a “zoar” os corintianos, cujo clube havia sido derrotado pelo alviverde. Alguns torcedores do alvinegro saíram do caminhão baú e, armados de paus e canos de ferro, deram algumas pancadas nos gozadores e danificaram o veículo em que estes estavam.
      Alcançados pela PM, foram todos encaminhados ao plantão policial, exceto um dos palmeirenses, que foi levado ao Pronto Socorro. Tão logo chegaram ao distrito policial, “materializaram-se” alguns advogados constituídos pelas torcidas para defender os seus membros. Lavrado o “termo circunstanciado de ocorrência”, já que, inicialmente, os crimes cometidos poderiam ser classificados como “de menor potencial ofensivo”. Encaminhado o “TCO” à Justiça, foram todos denunciados pelos crimes e foi decretada a prisão preventiva de todos.
      O que chamou a minha atenção nesse processo foi o seguinte: 1°) essas torcidas que se organizaram para irem aos estádios torcer pelos clubes, estão sofrendo um “desvio de finalidade”, prestando-se mais para encontros violentos entre elas ou mesmo entre alas da mesma torcida. As redes sociais têm sido de uma utilidade enorme para agendar estes encontros. 2°) os torcedores que sofrem as agressões não têm o menor interesse em que os agressores sejam punidos; pelo contrário, se fosse possível “retirariam a queixa” a fim de paralisar o processo punitivo. Uma das vítimas disse alto e bom som ao juiz durante a audiência que “já estava tudo certo, que ele não tinha interesse na punição dos agressores”. Esclareceu que os danos no veículo foram consertados e pagos pela torcida organizada a que pertenciam os agressores. 3°) muitos membros de torcida organizada têm uma vasta folha de antecedentes – no caso, um dos acusados no processo era aquele mesmo que soltou um rojão num estádio da Bolívia e matou um torcedor.
      Já se tentou judicialmente a extinção das torcidas organizadas, em vão, e essa tarefa hercúlea foi encetada pelo (então) promotor de Justiça Fernando Capez.
      Elas são um mal que deve ser combatido de outra forma.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Uma praça sem bancos

Uma música que marcou época, chamada “A Praça”, de autoria de Carlos Imperial, gravada por Ronnie Von no ano de 1967, e que foi um estrondoso sucesso, contém uma frase que diz assim: “sentei naquele banco da pracinha...”. O refrão diz assim: “a mesma praça, o mesmo banco”. É impossível imaginar uma praça sem bancos, ainda que hoje estes não sejam utilizados por aquelas mesmas pessoas de antigamente, como os namorados, por exemplo. Enfim, são duas ideias que se completam: praça e banco (ou bancos). Pois no Cambuí há uma praça, de nome Praça Imprensa Fluminense, em que os bancos entraram num período de extinção. Essa praça é erroneamente chamada de Centro de Convivência, sendo que este está contido nela, já que a expressão “centro de convivência (cultural)” refere-se ao conjunto arquitetônico do local: o teatro interno, o teatro externo e a galeria. O nome Imprensa Fluminense refere-se mesmo à imprensa do Rio de Janeiro e é uma homenagem a ela pela ajuda que prestou à cidade de Campi...

Legítima defesa de terceiro

Um dos temas pouco abordados pelos doutrinadores brasileiros é o da legítima defesa de terceiro; os penalistas dedicam a ele uma poucas páginas, quando muito. Essa causa de exclusão da ilicitude vem definida no artigo 25 do Código Penal: “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. Nessa definição estão contidos os elementos da causa de exclusão em questão: uso moderado dos meios necessários; existência de agressão atual ou iminente; a direito seu ou de outrem. Como se observa facilmente, a defesa é um repulsa a uma agressão, ou seja, é uma reação a uma agressão, atual (que está acontecendo) ou iminente (que está para acontecer). Trata-se, a causa de exclusão em questão, de uma faculdade que o Estado põe à disposição da pessoa de defender-se pois em caso contrário a atuação estatal na proteção dos cidadãos tornar-se-ia inútil. Não é uma obrigação, é uma faculdade. Caso, na...

Câmeras corporais

A adoção da utilização de câmeras corporais por policiais militares gerou – e gera – alguma controvérsia no estado de São Paulo, tendo sido feita uma sugestão que mais lembra um pronunciamento de Eremildo, o Idiota (personagem criado por Elio Gaspari): “os soldados da força policial usariam as câmeras, mas as ligariam apenas quanto quisessem”. Essa tola sugestão tem como raiz o seguinte: nas operações em que pode haver alguma complicação para o policial ele não aciona a câmera; mas demais, sim. Apenas a título informativo, muitos países do mundo tem adotado essa prática: em algumas cidades, como, por exemplo, nos Estados Unidos, até os policiais que não trajam fardas estão utilizando esses aparatos. Mas, a meu ver, o debate tem sido desfocado, ou seja, não se tem em vista a real finalidade da câmera, que é a segurança na aplicação da lei penal, servindo também para proteger o próprio agente da segurança pública (tendo exercido, enquanto Procurador do Estado, a atividade de Defensor...