Uma cena insólita (ou a finalidade de pena)
Ao longo dos anos – talvez séculos – foram formuladas teorias a respeito da finalidade de pena, Ou seja: quando o Estado exerce o “jus puniendi”, impondo uma pena a alguém que cometeu um crime, deve buscar nessa atividade alguma finalidade? Prevenção geral e prevenção especial: estes são os dois principais ramos em que se divide o debate sobre este tema.
Dias atrás tive a oportunidade de constatar ao vivo se num caso específico a pena atingiu a sua finalidade: caminhava eu pela rua Ferreira Penteado e naquele trecho trabalhavam alguns presos do regime semiaberto, todos vestindo calça bege (“no país das calças beges”, da música dos Racionais MC “Diário de um detento”) que prestam serviços à municipalidade: eles arrancavam aqueles matinhos que nascem entre os paralelepípedos. De repente, aproxima-se em disparada uma pessoa, um homem, portanto um pacote de fralda e em seu encalço um pessoa uniformizada. Logo deu para deduzir que se tratava de um furto e o empregado da farmácia perseguia o larápio. Ao passar por um dos presos, este disse:
- devolve isso, meu irmão.
Ao que o outro respondeu:
- eu paguei.
Ao ouvir essa resposta, foi impossível não soltar uma sonora gargalhada. Metros adiante, porém, um pedestre derrubou o ladrão.
O diálogo entre o preso e o ladrão imediatamente me fez lembrar das teorias da finalidade da pena, tema que ensinei durante trinta anos na Faculdade de Direito da PUCCamp: para o preso, o “castigo” valeu, e aí temos a prevenção especial; já para o ladrão, não, tendo, assim, falhado a prevenção geral.
A adoção da utilização de câmeras corporais por policiais militares gerou – e gera – alguma controvérsia no estado de São Paulo, tendo sido feita uma sugestão que mais lembra um pronunciamento de Eremildo, o Idiota (personagem criado por Elio Gaspari): “os soldados da força policial usariam as câmeras, mas as ligariam apenas quanto quisessem”. Essa tola sugestão tem como raiz o seguinte: nas operações em que pode haver alguma complicação para o policial ele não aciona a câmera; mas demais, sim. Apenas a título informativo, muitos países do mundo tem adotado essa prática: em algumas cidades, como, por exemplo, nos Estados Unidos, até os policiais que não trajam fardas estão utilizando esses aparatos. Mas, a meu ver, o debate tem sido desfocado, ou seja, não se tem em vista a real finalidade da câmera, que é a segurança na aplicação da lei penal, servindo também para proteger o próprio agente da segurança pública (tendo exercido, enquanto Procurador do Estado, a atividade de Defensor...
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