Quando
analisam o crime sob o aspecto o sujeito ativo, os doutrinadores dividem-no em
unissubjetivos e plurissubjetivos. Nos primeiros, a infração penal pode ser
praticada por uma só pessoa, nada impedindo, porém, que dois ou mais dele
participem. Quanto aos segundos, há a exigência de que mais de uma pessoa
participe do delito. Como exemplo do primeiro, pode-se apontar o estupro; como
exemplo do segundo, aponta-se a associação criminosa (antes denominado
quadrilha ou bando), ou mesmo a organização criminosa. Os crimes
plurissubjetivos são ainda chamados de concurso necessário ou coletivos).
O
acontecimento que envolveu trinta e três estupros cometidos contra uma
adolescente e que mobilizou a opinião pública, com algumas autoridades querendo
simplesmente“tirar uma casquinha” (como é o caso do Ministro da Justiça, que,
como Secretário da Segurança Pública do estado de São Paulo, já praticava esse
hábito), outras visivelmente empenhados em descobrir os autores do fato, foi
apressadamente intitulado “estupro coletivo”, expressão que provoca uma redução
do conceito.
O
estupro, como já dito, é um crime unissubjetivo, ou seja, pode ser praticado por
uma só pessoa, nada impedindo que outros nele intervenham. A conceituação do
estupro está no artigo 213 e tem a seguinte redação: “constranger alguém,
mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou
permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”, cuja pena é de
reclusão, de 6 a 10 anos. Já no artigo 217-A está definido o “estupro de
vulnerável”, cuja descrição é a seguinte: “ter conjunção carnal ou praticar outro
ato libidinoso com menor de 14 anos”, com a pena de reclusão, de 8 a 15 anos. O
parágrafo primeiro deste artigo tem a seguinte redação: “incorre na mesma pena
quem pratica as ações descritas no caput
com alguém que, por deficiência mental, não tem o necessário discernimento para
a prática do ato, ou que, por qualquer outras causa, não pode oferecer
resistência”. Esta redação foi determinada pela Lei n° 12.015, de 7 de agosto
de 2009. Mas ela já, sob outra roupagem, existia no Código Penal. Pela
expressão “qualquer outra causa” entendia-se um torpor ocasionado por excessivo
cansaço e também o estado de embriaguez da vítima, situações em que a
capacidade de resistência fica diminuída ou anulada.
É
a hipótese, assim parece, desse “estupro coletivo” no que respeita à vítima
que, mesmo sendo maior de 14 anos, estava por assim dizer “dopada”, por
circunstâncias ainda desconhecidas, não podendo opor resistência aos desígnios
dos violadores.
Todavia,
não foi um estupro “coletivo”e sim foram 33 estupros, ou 66, ou 99, ou 132:
cada um dos estupradores que manteve conjunção carnal com a vítima cometeu,
como autor, um crime autônomo (o delito, já foi dito, é unissubjetivo) e em cada outra que prestou auxílio cometeu
outro crime, desta feita como partícipe. Se o sujeito ativo manteve conjunção
carnal e auxiliou em outras 32, responderá por 33 violações carnais: uma por si
mesmo e auxiliando nas outras 32. É, aqui, aplicada a regra do concurso de
pessoas (artigo 29 do Código Penal: “quem de qualquer forma concorre para o
crime, incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Pela
regra do artigo 69, somar-se-ão as penas.
Embora
seja muito precoce emitir opinião sobre o mérito da questão, uma coisa é certa:
denominar “estupro coletivo” é um conceito reducionista.
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