Pular para o conteúdo principal

Problema para uma geração



      Dizia o filósofo espanhol José Ortega y Gasset (“Rebelião das Massas”, entre outros), que uma geração dura em torno de trinta anos. Disse isso de passagem, sem maiores explicações, mas pode-se concluir que esse é tempo em que uma geração está apta a propor modificações e, mais importante, implementa-las.
      O caos na segurança pública no estado do Rio de Janeiro começou há mais de trinta anos – trinta e um para ser exato. Nesse ano, o Secretário de Polícia Civil (era esta o nome da pasta responsável pela segurança pública no estado) era Nilo Batista e o governador, Leonel Brizola. Em uma entrevista publicada nas páginas amarelas (azuis, vermelhas, não lembro ao certo) de uma “revista semanal de informação”, mais precisamente a revista ISTOÉ, disse o secretário de polícia civil uma frase que, de tão impactante, serviu como “chamada” à matéria, e que é a seguinte: “droga não é problema policial”. Segundo muitos, essa foi a senha que significou que a partir dali o combate ao tráfico de entorpecente não mais seria uma preocupação governamental. Até hoje, sempre que tem oportunidade, o ex-secretário nega ter tomado essa atitude.
      Desde então, a (in) segurança pública no Rio de Janeiro só tem piorado, a pronto de provocar uma intervenção federal com o envio de tropas militares àquele estado, e os imediatistas sempre reclamam que a violência continua imperando, ignorando que será necessário que outra geração aconteça – ou seja, trinta anos – para que o resultado seja revertido.
      A isso deve ser acrescentado que nesse interregno de 1987 até o presente aquele estado teve governadores que pensaram muito mais em si do que na população. Como exemplo maior disso é Sergio Cabral, um homem que já está condenado a mais de cem anos de reclusão (alguém pensará: com base no artigo 75 do Código Penal ninguém pode ficar preso por mais de trinta anos...) e que, não contente com cobrar propina de tudo quanto foi segmento produtivo, concedeu isenções fiscais aos amigos, diminuindo a arrecadação de tributos estaduais. O ditado antigo diz que “cada povo tem o governo que merece”: um eleitorado que vota num candidato chamado Garotinho e o elege deve merecer esse líder. Ou que vota num chamado “Pezão” não deve ser levado a sério - lembrei de dois animais que tiveram tantos votos que teriam sido eleitos há décadas: o macaco Tião e o rinoceronte Cacareco. Os eleitores, por gozação, e naquela época isso era permitido, votaram nesses dois animais, que estavam confinado nos zoológicos do Rio e de São Paulo.
      Quem quiser entender um pouco mais da (in)segurança pública do Rio de Janeiro deve ler três livros: Meu casaco de general, A elite da tropa (que deu origem ao filme Tropa de Elite) e Abusado. A leitura destas obras, aliada àquelas palavras de Nilo Batista, permitirá ter uma ideia mais condizente do que ocorre no Rio de Janeiro e concluir facilmente que a solução é possível, mas demora bastante, talvez uma geração.
     

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A assessora exonerade

Um fato tomou a atenção de muitos a partir de domingo quando uma assessora “especial” do Ministério da Integração Racial ofendeu a torcida do São Paulo Futebol Clube e os paulistas em geral. Um breve resumo para quem não acompanhou a ocorrência: a final da Copa do Brasil seria – como foi – no Morumbi, em São Paulo. A Ministra da Integração Racial requisitou um jato da FAB para vir à capital na data do jogo, um domingo, a título de assinar um protocolo de intenções (ou coisa que o valha) sobre o combate ao racismo (há algum tempo escrevi um texto sobre o racismo nos estádios de futebol). Como se sabe, as repartições públicas não funcionam aos domingos, mas, enfim, foi decisão da ministra (confessadamente flamenguista). Acompanhando-a veio uma assessora especial de nome Marcelle Decothé da Silva (também flamenguista). Talvez a versão seja verdadeira – a assinatura do protocolo contra o racismo – pois é de todos sabido que há uma crescente preocupação com o racismo nos estádios de fu

Por dentro dos presídios – Cadeia do São Bernardo

      Tão logo formado em Ciências Jurídicas e Sociais e tendo obtido a inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, prestei auxílio num projeto que estava sendo desenvolvido junto à Cadeia Pública de Campinas (esta unidade localizava-se na avenida João Batista Morato do Canto, n° 100, bairro São Bernardo – por sua localização, era apelidada “cadeião do São Bernardo”) pelo Juiz de Direito da 2ª Vara Criminal (que cumulava a função de Corregedor da Polícia e dos Presídios), Roberto Telles Sampaio: era o ano de 1977. Segundo esse projeto, um casal “adotava” uma cela (no jargão carcerário, “xadrez”) e a provia de algumas necessidades mínimas, tais como, fornecimento de pasta de dentes e sabonetes. Aos sábados, defronte à catedral metropolitana de Campinas, era realizada uma feira de artesanato dos objetos fabricados pelos detentos. Uma das experiências foi uma forma de “saída temporária”.       Antes da inauguração, feita com pompa e circunstância, os presos provisórios eram “aco

Matando por amor

Ambas as envolvidas (na verdade eram três: havia um homem no enredo) eram prostitutas, ou seja, mercadejavam – era assim que se dizia antigamente – o próprio corpo, usando-o como fonte de renda. Exerciam “a mais antiga profissão do mundo” (embora não regulamentada até hoje) na zona do meretrício [1] no bairro Jardim Itatinga.             Logo que a minha família veio de mudança para Campinas, o que se deu no ano de 1964, a prostituição era exercida no bairro Taquaral, bem próximo da lagoa com o mesmo nome. Campinas praticamente terminava ali e o entorno da lagoa não era ainda urbanizado. As casas em que era praticada a prostituição, com a chegada de casas de família, foram obrigadas a imitar o bairro vermelho de Amsterdã:   colocar uma luz vermelha logo na entrada da casa para avisar que ali era um prostíbulo. Com a construção de mais casas, digamos, de família,   naquele bairro, houve uma tentativa de transferir os prostíbulos para outro bairro que se formava, mais adiante