Aquilo que vulgarmente se conhece como “chantagem” tem, em Direito Penal, outro nome: extorsão. É classificado como um crime patrimonial e vem definido no artigo 158 do Código Penal: “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem, indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa”. A pena é de reclusão, de 4 a 10 anos, mais multa (esta é fixada em dias-multa, no mínimo 10, no máximo 360, no valor de 10% do salário mínimo a 3 vezes o mesmo salário). No conceito de grave ameaça, e os penalistas dão isso como exemplo, está contida a ameaça de revelar fatos desonrosos da pessoa de quem quer se obter a vantagem econômica indevida, ainda que os fatos sejam verdadeiros. Por exemplo: uma pessoa descobre que um homem casado vive uma aventura extra conjugal e ameaça contar o fato à esposa do adúltero caso não lhe seja dada determinada quantia. O fato em si é verdadeiro e o que lei reprime é a intenção da pessoa em pretender obter uma vantagem, que, sob todos os aspectos, é reprovável.
Nas redes sociais a chantagem vem sendo amiúde aplicada, mas sob outra roupagem: o chantagista cria a situação a partir da qual ele tentará obter a vantagem indevida. Funciona assim: uma mulher – pelo menos é assim que a pessoa se apresenta em seu perfil, o que vale dizer, pode não ser mesmo uma mulher – e procura criar um relacionamento com a futura vítima, sempre um homem casado. Feita a ligação, passa-se à conversa, a princípio normal, descambando depois ao erotismo (chegando a quase um sexo virtual – se é que existe...), à troca de fotos em posições sexuais, e por aí adiante. Devidamente fisgada a vítima, vem a extorsão: se a pessoa não pagar determinada quantia, as conversas e as fotos serão encaminhadas aos familiares da vítima (esposa, filhos). Como o chantagista sabe da existência de familiares? Fácil: uma busca no Facebook com o sobrenome da vítima revelará os nomes de todos os seus parentes.
Durante a pandemia fui procurado duas vezes por homens que caíram nesse golpe. No segundo deles, que foi o mais interessante, a (o?) chantagista cometeu um erro crasso: deu o número de uma conta bancária em que o dinheiro deveria ser depositado. Como a conta contém todas as informações sobre o correntista, foi só dizer que não seria paga nenhuma quantia e que seria requerida a instauração de inquérito policial contra a correntista, pelo crime de extorsão, que os malfeitores prontamente desistiram da empreitada e afirmassem que destruiriam tudo o que tinham coletado como prova do, digamos, “idílio” virtual entre a vítima e o chantagista.
É o preço do progresso: antes das redes sociais, o golpe mais empregado era o do falso sequestro, que era feito via telefone: agora é a extorsão (verdadeira) feita utilizando-se as redes sociais.
Um dos temas pouco abordados pelos doutrinadores brasileiros é o da legítima defesa de terceiro; os penalistas dedicam a ele uma poucas páginas, quando muito. Essa causa de exclusão da ilicitude vem definida no artigo 25 do Código Penal: “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. Nessa definição estão contidos os elementos da causa de exclusão em questão: uso moderado dos meios necessários; existência de agressão atual ou iminente; a direito seu ou de outrem. Como se observa facilmente, a defesa é um repulsa a uma agressão, ou seja, é uma reação a uma agressão, atual (que está acontecendo) ou iminente (que está para acontecer). Trata-se, a causa de exclusão em questão, de uma faculdade que o Estado põe à disposição da pessoa de defender-se pois em caso contrário a atuação estatal na proteção dos cidadãos tornar-se-ia inútil. Não é uma obrigação, é uma faculdade. Caso, na...
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