Os
eletro-eletrônicos sofrem constantemente alterações: à boca pequena diz-se que
em poucos meses um aparelho de última geração “envelhece”. Também os “gadgets”
têm conhecido um constante progresso e aprimoramento. Os telefones celulares
ora diminuem de tamanho, ora aumentam; o mesmo se diga dos computadores
pessoais, bem como dos “notebooks”. Os televisores formam um caso à parte, com
as telas cada vez maiores. Mas o progresso não se limita aos tamanhos das telas
e sim também a outros componentes, mas o que é notável mesmo é o tamanho da
tela. Plasma, LCD e outros avanços tornam-se secundários quando se analisa a
tela, cada vez maior – e o preço aumenta na mesma proporção da tela. Sem
dúvida, todos esses aparelhos fazem parte do objeto de desejo de todas as
pessoas. E quando não se tem o bem, nem dinheiro para adquiri-lo, e nem
vergonha na cara, furta-se-o. Sempre se admitiu que o sonho do brasileiro era a casa própria: aproveitando-se desse fato, o governo federal criou um projeto em que a casa própria é atrelada à própria vida. Porém, Assis Chateaubriand disse que o maior sonho era o carro próprio (dessa ideia o governo também se apropriou ao reduzir a zero o IPI). Modernamente, é de se crer que o sonho é mesmo um televisor de última geração.
Aquela
audiência da qual eu iria participar era referente a um caso de furto
qualificado pela destruição (ou rompimento) de obstáculo, mais conhecido como
“arrombamento” pela mídia e parte da polícia: o “amigo do alheio” arromba a
porta da casa ou mesmo uma janela, entra no imóvel e dali subtrai os objetos
que deseja levar – tantos quantos puder carregar. No caso presente, o ladrão
havia levado um televisor de muitas polegadas.
Na
audiência seriam ouvidas as testemunhas de acusação, em cujo rol figurava a
vítima, ou seja, o dono do objeto subtraído. Obviamente, ela não é testemunha,
mas as suas declarações são tomadas na mesma audiência em que são ouvidas as
testemunhas de acusação. Estas, em geral, são os policiais que investigaram o
crime ou os que participaram da prisão do suspeito. Isso ocorre porque esse
tipo de delito – o furto qualificado – é, as mais das vezes, praticado sem que
o larápio possa ser visto – a não ser que, por muita falta de sorte, ele seja
surpreendido em plena ação. Mas isto não havia ocorrido no caso.
Ouvida
a vítima, ela fez a narrativa de praxe: estava fora de casa e quanto retornou
encontrou a porta arrombada, tudo revirado e deu pela falta de alguns bens.
Dentre os bens furtados, disse a vítima, havia um televisor de muitas polegadas
(a memória me falha agora para dizer o número exato). Depois da vítima, vieram
os policiais que haviam investigado caso, descoberto o nome do ladrão e, hurra,
encontrado e apreendido o televisor. Durante o seu depoimento, o policial disse
que ao entrar na casa em que morava o autor do crime patrimonial, encontrou o
televisor, porém o local era uma edícula e o aparelho estava num quarto muito
pequeno e o televisor era tão grande que era impossível assistir a qualquer
programa naquele aparelho, pois este ficava “encostado” no rosto da pessoa: não se conseguia guardar a distância mínima recomendada pelo fabricante e pela ciência. Quase era necessário assistir aos programas do lado de fora do quarto, pela janela.
O
aparelho foi apreendido e devolvido ao proprietário, coisa rara de acontecer.
Pareceu-me, pela situação, que o desejo de obter, ainda que de forma ilícita,
aquele objeto era maior do que o número de polegadas do televisor, também maior
da modesta habitação em que ele vivia, mas, mesmo assim, para satisfazer o seu
desejo ele o furtou, embora não pudesse estar usufruindo-o.
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