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A "day" e a ofensa "racista"




   
   Mais uma ofensa “racista” estourou na mídia e, como é de praxe, envolvendo uma pessoa famosa: no caso, a filha de um casal famoso. Trata-se, a vítima, da filha de Bruno Gagliasso e Giovanna Ewbank, atingida por palavras proferidas por uma – ora chamada de “socialite”, ora auto-intiulando-se “escritora” (juro que não conheço nenhuma obra escrita por tal pessoa) – brasileira residente no Canadá.
      Tomado por uma curiosidade – jurídica, claro – incontrolável, pus-me a pesquisar (ah! Google) não somente em que teria consistido a ofensa, mas, e principalmente, quem era a ofensora.
      Antes, é de se registrar que quando a ofensa – penalmente tem o nome de injúria por preconceito – atinge um famoso ou filho (a) de famoso rapidamente torna-se manchete em toda a mídia. Quando se trata de um anônimo passa despercebida.
      Pois bem: a dita ofensora chama-se (e chama a si mesma assim) Day, abreviação de (suponho) Dayane (ou Dayanne) e tive a oportunidade de assistir à uma sua postagem e tive um choque ao ouvir a sua (suposta) defesa quanto àquilo que proferiu. Não consegue convencer nem a si mesma, foi a impressão que me provocou. Uma das passagens: não é crime em nenhum lugar do mundo afirmar que uma pessoa é feia. Se ela “apenasmente” (como dizia o Coronel Odorico Paraguaçu) emitiu somente uma opinião nesse sentido, talvez não tenha mesmo cometido nenhum delito; mas, quando a opinião expressada contém um componente ofensivo, pode ser considerado crime e contra honra, a injúria.
      Foi requerida a instauração de inquérito policial e a chegada do casal VIP foi cronometrada e amplamente coberta pela imprensa: ele chegou pontualmente às 9 horas e 40 minutos na Delegacia de Polícia, tendo sido atendido pela delegada, que, após a lavratura do boletim de ocorrência foi entrevistada e mostrou-se também indignada pelo ocorrido.
      O fato da (suposta) ofensora residir em outro país não impede que ao fato seja aplicado o Código Penal brasileiro e esse fenômeno (o de aplicar a lei brasileira a fato praticado no Exterior) dá-se o nome de “extraterritorialidade condicionada”, prevista no artigo 7° do Código Penal. São várias as condições, destacando-se duas delas: a entrada do sujeito ativo no crime no país (Brasil) e ser o fato crime também no país em que ele foi praticado. Há outro complicador: pode ser que o Canadá pretenda também instaurar uma apuração criminal, já que o fato ocorreu ali. Com o Brasil fazendo o mesmo, surgirá um conflito positivo de competência.
      Chamou-me a atenção o fato de o pai da criança ofendida dizer, quando entrevistado (claro!), que a ofensora iria para a cadeia. Deixando de lado essa cultura arraigada de que todo ato delituoso deva provocar o encarceramento do seu autor, para a decepção do astro global cabe um esclarecimento: a pena para o crime de injúria por preconceito é de 1 a 3 anos de reclusão (mais multa) e caso haja condenação, ainda que em seu patamar máximo, o que é impossível, poderá ser substituída, já que não houve o emprego de violência ou grave ameaça, por pena restritiva de direitos, na modalidade, a preferida dos magistrados, prestação de serviços à comunidade.  

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