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A legítima defesa e o porte de arma



      A legítima defesa é uma causa de exclusão da ilicitude, o que vale dizer, o fato praticado sob a égide dessa excludente é considerado lícito; em outras palavras, não é criminoso. A sua definição está no artigo 25 do Código Penal, “verbis”: “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente os meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. Dessa definição legal extraem-se os seus elementos constitutivos, dos quais ressalta o seguinte: “meios necessários”. Quando a pessoa encontrar-se na posição de vítima de uma agressão injusta a direito seu (e não se deve entender por “agressão” no seu sentido vulgar, o de lesão corporal [fulano foi “agredido” e ficou gravemente ferido]), qualquer direito, está autorizada pelo Estado a repelir essa agressão. Para essa repulsa ela pode usar os meios necessários, desde que de forma moderada. O Código Penal não especifica, e nem poderia fazê-lo sob o risco de tornar-se casuístico, o que se deve entender por essa expressão e cabe à doutrina dizê-lo. Alguns entendem que os meios necessários devem ser aqueles que menos mal causarem ao agressor. Outros entendem que devem ser aqueles dos quais o agredido pode lançar mão. Se ele tiver ao seu dispor uma arma de fogo calibre 9mm, pode utiliza-la, procurando, porém, atingir partes do corpo do agressor não letais. Numa situação estressante como o é a de reação a uma agressão injusta, não se pode medir a reação, como dizia a antiga doutrina, em balança de farmácia (hoje dir-se-á “de manipulação). Cada caso concreto terá a sua análise.
      Na legítima defesa, dizem alguns, a pessoa agredida faz o trabalho que cabia ao Estado fazer: proteção.
      Dizer que permitir ao cidadão que se arme não equivale a dizer que se está autorizando-o a atuar em legítima defesa: portando ou não arma ele está sempre autorizado a defender-se. Além das exigências acima explicitadas, outras podem ser ditas para melhor entendimento do aduzido. Na situação, há um bem atacado que merece ser preservado em detrimento de outro bem, que até antes do início da agressão também desfrutava da proteção penal, mas que deve ser sacrificado, no todo ou parte, para fazer cessar a agressão. Um ataque injusto ao patrimônio, por exemplo, não autoriza que o agredido tire a vida do agressor: a vida é um bem mais importante do que o patrimônio. O titular deste bem pode defende-lo mas causando o menor dano a qualquer bem do agressor até que ele cesse a agressão.
      Ademais, não existe legítima defesa predisposta, ou seja, a pessoa estar antes mesmo, e sempre, da (hipotética) agressão preparada para repeli-la. As agressões dificilmente são previsíveis. As mais das vezes são imprevisíveis.
      O que é mais importante é proporcionar ao cidadão a tranquilidade que ele merece para, como se dizia antigamente, “dormir de portas abertas”.

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