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Ativismo jurídico supremo

  


      Ativismo judicial, considerado como um fenômeno jurídico, costuma ser designado como uma postura proativa do Poder Judiciário na interferência de maneira regular e significativa nas opções políticas dos demais poderes, conforme a enciclopédia interativa Wikipédia.
                E muito se tem dito acerca da ocorrência desse fenômeno na mais alta corte de justiça do país, fato, claro, negado pelos excelentíssimos senhores ministros.
                1° ) estava pautado para ser julgado pela alta corte a descriminalização do porte de entorpecente para uso próprio. Essa modalidade de crime contra a saúde existe em lei específica e a descriminalização de um fato somente pode se dar por intermédio de outra lei. Afinal, o país vive sob o princípio da legalidade e em matéria de Direito Penal somente uma lei pode tornar um fato delituoso, descrevendo a conduta que se quer que seja punida e cominando a pena que será aplicada a quem praticá-la (a conduta). A pedido do presidente da República, o processo foi retirado de pauta. É certo que a punição ao drogadicto vem sendo seguidamente abrandada, mas ainda existe.
                2°) durante o julgamento de um “habeas corpus” em que pretendia a revogação de prisão preventiva que fora decretada contra um médico do Rio de Janeiro acusado de ter cometido um crime de aborto, um dos ministros, afastando-se do tema, pôs-se a divagar sobre a punição do aborto, afirmando que a sua classificação como crime deveria ser revista e blá blá blá. O passo seguinte, dentro do ativismo jurídico que ali impera, seria, num julgamento, descriminalizar o crime de aborto.
                3°) o mais grave, porém, e em que o ativismo jurídico atingiu o ápice, deu-se naquele julgamento em que o pleno da suprema corte, não por unanimidade mas por maioria, equiparou a homofobia ao crime de racismo. Quase infartei assistindo às perorações dos senhores ministros que votaram a favor da dessa decisão – e foram oito -, pelo malabarismo verbal que eles fizeram para concluir pela equiparação. Deixou de ser guardião da Constituição para simplesmente desrespeitá-la. A Constituição da República Federativa do Brasil estabelece, em seu artigo 5°, inciso XXXIX, que “não há crime sem LEI anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. E o artigo 1° do Código Penal repete-o “ipsis litteris” (em vernáculo: “literalmente”).  Esse princípio, que, no campo do Direito Penal, representa a maior garantia que se pode dar ao cidadão contra possíveis abusos e arbitrariedades, tem uma história muito bonita: alguns colocam o seu início no artigo 39 (coindicência ou não, o esmo número do inciso do artigo 5° que o define)
da Magna Carta de João Sem Terra, tendo sido seguidamente pelos países civilizados e desprezado pelos países totalitários. Óbvio: aos déspotas não interessa que os súditos tenham direitos, somente obrigações.
              O que leram entenderam que não sou contra a criminalização da homofobia: apenas não concordo com a forma como ela foi feita, pois pisoteou o mais importante princípio constitucional de garantia do cidadão.  

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