Ao tomar conhecimento de
que atuaria, óbvio que como defensor dativo oficial, na defesa de um daqueles
réus, estremeci, logo imaginando que a minha tarefa seria hercúlea. Tratava-se,
sim, de mais um homicídio, porém, seja pela motivação, seja pela forma de execução,
fugia aos padrões dos processos em que até então eu atuara. E que tinham sido
muitos.
Segundo os indícios
apontavam, a motivação do crime seria um barraco numa favela em Campinas,
contudo, não esclareciam se o ilícito se dera em disputa da posse (ou
propriedade?) do imóvel ou, então, uma perlenga pelos alugueis atrasados. Seja
por qualquer motivo desses dois que fosse, o homicídio já tinha sido
classificado como qualificado e pelo motivo torpe. Os, a esta altura, acusados,
posto que já havia denúncia oferecida contra ambos, haviam tirado a vida da
vítima no interior do barraco – móvel do delito – em que esta morava e cortaram
a sua cabeça. Esta foi colocada no ponto de ônibus da linha que passava
defronte ao local do crime e ali deixada certamente para mostrar o que acontecia
com quem descumprisse as regras existentes naquela comunidade.
As fotos feitas pelos
peritos do Instituto de Criminalística (naqueles tempos chamado de “Instituto
de Polícia Técnica”) eram tétricas e extremamente impressionantes: dentro do
barraco, o corpo sem a cabeça, com uma roda de sangue no local onde estivera a
cabeça; esta, no banco do ponto de ônibus e de olhos abertos. Antes de
conseguir pensar na impressão que a exibição das fotos causaria no espírito dos
jurados no dia do julgamento, pensei num filme impressionante de Roman
Polanski, chamado “O inquilino”, em que há a seguinte indagação: “eu e minha
cabeça ou eu e meu corpo”, como se perguntando: “onde está o eu”?
Felizmente, mal eu havia
apresentado a defesa prévia, a família do réu que eu defendia contratou um
advogado, de forma que fiquei liberado de prosseguir na sua defesa. Foi um
alívio.
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