Melhor
seria dizer “achado não é furtado”: porém, o conhecimento leigo substitui o
furto pelo roubo, entendendo como sendo este crime qualquer subtração de coisa
alheia móvel. Há uma grande diferença entre o furto e o roubo (e os penalistas,
e, creio, os advogados em geral a conhecem): no primeiro, a subtração se dá sem
que haja o emprego de violência ou grave ameaça a pessoa; no segundo, claro, a
subtração da coisa móvel se dá empregando-se a violência ou grave ameaça contra
a pessoa, registrando-se que estas duas formas de constrangimento podem dar-se
antes ou durante a subtração; em algumas hipóteses, após a subtração.
Após
estas breves explicações, é do conhecimento de todos que para o povo brasileiro
em geral aquilo que é encontrado na rua e que foi perdido por alguém, o
“achador” tem o direito “legítimo” de apropriar-se, tornar-se dono daquilo. Algumas vezes alguém foge desse padrão e imediatamente surge
nas redes nacionais de televisão, especialmente no telejornais do horário nobre
como se fosse um ato do mais puro heroísmo. Nos tempos atuais, candidata-se a
frequentar os portais de notícia. Um gari que encontrou uma “bolada” e a
devolveu; ou um motorista de táxi em cujo veículo um passageiro desatento esqueceu
um aparato eletrônico valioso não pelo seu preço, mas pelo seu conteúdo: um
notebook que contém uma parte da vida de seu proprietário, e o restitui.
Pois é, para a desilusão de todos quantos
acreditam que “o achado não é roubado”,
e que, portanto, pode ser livremente apropriado, existe um delito contra o
patrimônio chamado “apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou
força da natureza”, descrito no artigo 169 do Código Penal, cujo teor é o
seguinte: “apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro,
caso fortuito ou força da natureza”, com a pena de detenção, de 1 mês a 1 ano,
mais multa. O que interessa aqui: o parágrafo único do artigo estabelece que
“na mesma pena incorre”: III – quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria,
total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor,
ou de entregá-la à autoridade competente, dentro do prazo de 15 dias”.
A
não ser que sejam coisas personalizadas, com o nome do proprietário nelas
inscrito, fica difícil, quando não impossível, restituí-las ao dono ou legítimo
possuidor, o que leva o achador a tornar-se obrigado a entrega-las à autoridade
competente. Uma “bolada” que alguém perdeu: é quase impossível devolvê-la
porque o dinheiro não traz impresso o nome de seu proprietário.
O
Código de Processo Civil dedica um capítulo, o VIII, no título II – dos procedimentos
especiais de jurisdição voluntária, a especificar como deve se proceder em caso
de encontrar coisa perdida. O capítulo chama-se “das coisas vagas”. O artigo
1170 tem a seguinte redação: “aquele que achar coisa alheia perdida, não lhe
conhecendo o dono ou legítimo possuidor, a entregará à autoridade judiciaria ou
policial, que a arrecadará, mandando lavrar o respectivo auto, dele constando a
sua descrição e as declarações do inventor”. Inventor, segundo o dicionário
Houaiss, significa (também) uma pessoa que encontra coisa que outra perdeu e
fica obrigada a restitui-la.
Há
outros artigos disciplinando o tema e deles merecem ser feitos estes registros: se a coisa não for reclamada, será alienada
em hasta pública, e, deduzidas do preço as despesas e a recompensa do inventor,
o saldo pertencerá, na forma da lei, à União, ao Estado ou ao Distrito Federal;
se o dono preferir abandonar a coisa, poderá o inventor requerer que lhe seja
adjudicada.
Caso
a pessoa não a devolva, cometerá o crime previsto no artigo 169, parágrafo único,
inciso III. Quem acha e a devolve, tem direito a uma recompensa.
“O
achado não é roubado; é apropriado."
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