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Mostrando postagens de maio, 2013

Estilo Larry David

            Para quem não conhece e nunca ouviu falar, Larry David foi um dos criadores da “situation comedy” de maior sucesso no mundo: Seinfeld. O outro criador, claro, foi Jerry Seinfeld. A série esteve no ar durante 10 anos, encerrando-se em 1998 e não houve dinheiro que convencesse os seus criadores a continuarem criando e gravando os episódios. Falou-se em 1 milhão de dólares para Jerry por capítulo. Até hoje, passados 15 anos de seu encerramento, ela continua em exibição em redes e canais, no Brasil, nos EUA e em outros países do mundo.             A primeira vez que estive em NY foi no ano de 1998. Uma manhã, caminhando pela avenida Broadway, em Times Square, vi um rapaz, usando quipá, distribuindo folhetos em que – foi o que chamou a minha atenção – estava escrito a palavra Seinfeld. Eu já sabia, pois era fã, que seria o último ano da série e me apressei em apanhar...

As Ordenações Filipinas e a recompensa estatal

              Quando o Brasil foi descoberto, passaram a ter aplicação no novo território a legislação do país descobridor, no caso, Portugal. Os códigos portugueses eram chamados de ordenações e em geral levavam o nome do soberano. Havia as Ordenações Afonsinas, as Manuelinas e as Filipinas. Estas últimas continham em seu Livro V as disposições penais e foram as que tiveram mais aplicação no Brasil, de 1603 a 1830. Ler um desses livros em sua linguagem original é um mergulho no passado: ali o pecado era tratado como crime e essa era mesma a nomenclatura: “peccado”. Por exemplo, no Título XIII estava escrito assim: “dos que commettem peccado de sodomia, e com alimarias”. O Direito Penal descaradamente mesclado coma religião católica.             A pessoa que cometia o crime de “molície”, difícil de ser descoberto, caso fosse condenada, perdia a m...

Campinas às moscas

                Campinas – que saudade! – já foi uma referência cultural, médica e universitária. A qualidade de vida era uma das melhores do país. Merecidamente chamada de “princesa d’oeste”, tinha duas agremiações futebolísticas – uma delas a mais antiga do Brasil – que revelaram craques de alto nível que fizeram parte da seleção brasileira.             Porém, durante mais de uma década a cidade praticamente esteve sem prefeito, ou seja, de alguém que ocupasse o palácio dos jequitibás com um plano de administrar a cidade condignamente. Tudo se deteriorou: as praças passaram a ser vítimas de vândalos, o trânsito ficou semelhante ao de uma capital, e, no campo cultural, passou a não ter um teatro. Campinas tinha um teatro que era maravilhoso, ali na praça atrás da catedral e onde hoje é uma loja (sim, uma loja...), que foi posto abaixo, e, em seguida, foi ...

Crucificando o filho

                          O Código Penal prevê que as pessoas, classificadas como inimputáveis, que não têm capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se conforme esse entendimento, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, são isentos de pena; porém, reserva a eles a imposição de medida de segurança [1] . A esquizofrenia, no cotidiano jurídico-penal, é a doença mental que mais ocorre, especialmente nos crimes contra a vida; dentre estes, o homicídio. E, desgraçadamente, a grande maioria de homicídios ocorre entre familiares.                         A família morava no Parque Oziel; o marido trabalhava, e eles tinham um filho pequeno, um bebê. Habitavam um barraco dentre aqueles incontáv...

Caixas eletrônicos, arrastões etc e as finalidades da pena

              No estado de São Paulo - e em algumas partes do Brasil - o público assiste, impotente, a uma onda de delitos contra o patrimônio nunca antes vista e com uma característica interessante: a migração – pode ser chamada de mutação – de uma modalidade a outra. Inicialmente foram os arrombamentos de caixas eletrônicos com o uso de maçarico e quase concomitantemente a “saidinha” de banco. Depois vieram os “arrastões”, inicialmente em bares e restaurantes. Essa modalidade passou a ser praticada em festas a que acorrem um número incontável de pessoas – como, por exemplo, na “virada cultural”. Como novidade, veio a “gangue da marcha a ré”. O que leva as pessoas a descaradamente praticarem esses delitos, muitas vezes sendo filmados por câmeras   de segurança?             Muito se tem escrito e falado acerca da finalidade da pena: a discussão teve Sênec...

Prendendo o morto

              Não lembro por qual crime ele tinha sido condenado; tenho certeza, porém, de que não foi contra a vida (doloso) porque o processo tramitava na 4ª Vara Criminal da comarca de Campinas: eventualmente, eu ali atuava. E, também, tenho certeza de que a pena imposta não fora alta, pois havia sido concedida a suspensão condicional da execução da pena (“sursis”) [1] . Designada data de audiência de advertência (também chamada de admonitória), o condenado não compareceu. O escrevente “de sala” (era assim chamado porque trabalhava na sala de audiências, pelo menos por um período, o da tarde, datilografando os depoimentos, declarações e interrogatórios) certificou que a audiência não havia se realizado em face do não comparecimento do condenado. Determinou, então, o magistrado que fossem os autos remetidos ao Ministério Público para manifestação (“vista ao MP”). O Promotor de Justiça, afoitamente, leu certidão d...

O mundo jurídico de pernas para o ar

              Segundo a teoria tridimensional do direito, de autoria de Miguel Reale, do atrito entre o fato e o valor surge a norma, mas o processo criativo, por assim dizer, prossegue, pois entra em ação a interpretação, que, em Direito Penal, dependendo de quem faz a interpretação (quanto ao sujeito), manifesta-se sob os nomes de autêntica, judicial (ou jurisprudencial) e doutrinária. Essa forma de “dizer o direito” conhece limites, que em Direito Penal são rígidos, impostos pelo princípio da reserva legal.             De uma época aos dias atuais, os fatos têm atropelado a doutrina – tão farta no Brasil (qualquer um se propõe a escrever um livro e uma editora qualquer se dispõe a publicá-lo – talvez isso se deva ao enorme número de faculdades de direito existentes no Brasil).           ...

Briga na festa junina

              Era período das festas juninas e uma delas estava ocorrendo numa casa num bairro que, naquela época, era considerado afastado, mas que hoje não parece tão distante em face do grande crescimento da cidade. A casa era modesta. Certamente as bebidas servidas eram o tradicional “quentão” e, óbvio, cerveja, sem faltar a bebida brasileiríssima, a pinga.             Houve uma discussão entre dois convivas e um deles sacou um canivete, cuja lâmina alcançava alguns centímetros (na minha infância, na cidade em que eu a passei, tal arma “branca” era chamada de “pica-fumo”, pois era comum qualquer pessoa que fumasse portar um desses para “picar” o fumo de corda e confeccionar um “picadão”), e desferiu um golpe no abdôme do seu , ferindo-o sem gravidade. Foi apenas um golpe. O Delegado de Polícia classificou o fato como lesão corporal, porém o Ministério Púb...

As várias mortes do prefeito (capítulo 14)

No dia 26 de setembro, foi ouvida a proprietária do veículo Vectra prata, de quem ele fora roubado no dia 24 de abril daquele ano, por volta de 9,15 horas, por dois desconhecidos, um de cor parda, o outro ela não conseguiu ver; o fato ocorreu em Uberlândia. Apresentou riqueza de detalhes, bem como documentos (boletim de ocorrência, recibo de quitação de sinistro e outros).                         No dia seguinte, 27 de setembro, foi expedido ofício pela autoridade policial ao Juiz de Direito Corregedor e da Polícia Judiciária para que a empresa operadora de telefonia fixa, Telefônica, fornecesse a relação dos telefonemas feitos para os números 32313900 e 32311325, instalados na Delegacia Secional, no dia 25 de setembro, entre as 19,30 e as 20,00 horas; não esclarecia o motivo. Retificou, por outro ofício, a data: 24 de setembro.    ...

Legítima defesa de terceiro

              Estas histórias eu vivi não como profissional do Direito Penal, mas sim como mero cidadão que pretendia prestar auxílio a quem necessitava: neles, certamente configuraria legítima defesa de terceiro, um dos temas mais polêmicos em Direito Penal.             Era um domingo pela manhã, horário em que muitas pessoas dirigiam-se à Igreja do Liceu Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora para participar da missa e eu estava andando de bicicleta pelas ruas do bairro, pois morava muito próximo do Liceu, com os meus filhos. Tive a minha atenção despertada pela atitude de dois rapazes que por ali perambulavam, em, por assim dizer, “atitude suspeita”: é que eles não moravam ali e estavam, pareceu-me, observando as casas. Numa das voltas, deparei com um deles sentado na mureta (era outro tempo: as casas tinham muros baixos) da casa que ficava na esqui...

O Direito Penal e os animais

                            Nos presentes dias, os animais são tratados quase como humanos – em algumas hipóteses, até melhor. Pululam as lojas especializadas em artigos para mascotes, onde de tudo pode ser encontrado para satisfazê-los (e aos seus proprietários, evidentemente). No projeto do Código Penal que ora tramita no Senado Federal, a pena para quem omitir socorro a um animal é mais grave do que a prevista para a omissão de socorro de pessoa (humana). Claramente, essa opção viola o princípio da proporcionalidade das penas, mas é possível que tal desvio seja corrigido – afinal, o projeto está em tramitação, podendo (e devendo, em alguns casos, como o presente), sofrer alterações por meio de emendas.                         Porém, ...