Existem
temas tabus cuja abordagem desencadeia emoções profundas em grande parcela da população: tais assuntos não são abordados nem
em campanhas políticas, pois os candidatos tremem de medo de desagradar parte
do eleitorado e com isso perder votos.
Um
dos temas é o aborto. Sabe-se que no Brasil há duas modalidades de aborto
permitido: o aborto sentimental e o aborto necessário, também chamado de
terapêutico. Eles existem, fixando-se apenas na existência do Código Penal,
desde o ano de 1940 (é deste ano o atual código, tendo entrado em vigor a 1° de
janeiro de 1941); consiste o primeiro na interrupção da gravidez quando ela
resulta de crime contra a dignidade sexual, mais especificamente contra a
liberdade sexual, vale dizer: estupro. Esta modalidade deve ser precedida “de
consentimento da gestante, ou, quando incapaz, de seu representante legal
(artigo 128, inciso II). O segundo ocorre quando “não há outro meio de salvar a
vida da gestante” (artigo 128, inciso I); em qualquer das modalidades, deve ser
a interrupção praticada por médico (artigo 128, “caput”).
Há
mais uma modalidade de aborto permitido, esta não constante em lei, mas
decorrente de decisão do Supremo Tribunal Federal, que se deu no julgamento da
Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental número 54, em razão da qual a
interrupção de gravidez quando o feto padece de anencefalia não se tipifica como
crime contra a vida. Antes que o plenário do Supremo fizesse esse julgamento,
em várias oportunidades requeri à Vara do Júri da comarca de Campinas
autorização para a interrupção da gravidez em caso de feto com deformação que o
tornava inviável para a vida extra-uterina. Eram casos de feto anencefálico,
agenesia (ausência de rins), e de ausência de coluna vertebral. Os mais
constantes eram os de anencefalia, e, não importando qual fosse a anomalia, o titular da
vara sempre concedia a autorização. Estando ele de férias, e por coincidência,
também eu, o meu substituto protocolou um pedido (o feto era hidranencefálico:
além de não ter encéfalo, havia água em seu cérebro) e a substituta do
magistrado indeferiu-o. Retornando das férias, fiz um pedido de “habeas corpus”
ao Tribunal de Justiça prevendo, porém, que seria indeferido, como foi, mas
consegui a autorização no Superior Tribunal de Justiça a quem recorri por via
de outro “habeas corpus” (maiores detalhes estão em meu livro “Casos de júri e
outros casos”, capítulo “Feto hidranancefálico").
São,
três, portanto, as modalidades de aborto permitido.
Há
um movimento, todavia, que luta pela pura e simples liberação do aborto,
respeitado, claro um limite, pois, dependendo do tempo de desenvolvimento do feto
se converterá em verdadeira cesárea. Países da Europa já seguem esse modelo, o
de respeitar um tempo, chamado magistralmente por Claus Roxin de “solução de
prazo” (o outro modelo chama-se “solução de indicações”, que é o seguido pelo
Brasil): na Alemanha, o aborto pode ser realizado até a décima-segunda semana, desde que a
gestante tenha se consultado numa agência de aconselhamento. Na Espanha também é
permitido.
Há
um projeto de Código Penal tramitando no Senado Federal em que o crime de
aborto sofrerá profundas modificações, porém o artigo terá o mesmo
número (128): será mantido o terapêutico (“risco à vida ou à saúde da gestante”-
inciso I), bem como o sentimental (“violação da dignidade sexual” – inciso II).
Há, como novidade, a possibilidade de interrupção quando a gravidez resultar de
“emprego não consentido de técnica de reprodução assistida” – inciso II,
segunda parte), bem como a interrupção se “comprovada a anencefalia ou quando o
feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida extra-uterina, atestado, em ambos os casos, por dois
médicos” inciso III). A novidade maior e mais bombástica está no seguinte: caso
aprovado o projeto da forma como foi redigido, poderá ser interrompida a
gravidez até a décima-segunda semana “por vontade da gestante... quando médico
ou psicólogo constatar que a mulher não apresenta condições psicológicas de
arcar com a gravidez” (inciso IV). O parágrafo único do artigo determina que
nas hipóteses tratadas nos incisos II e II, bem como na segunda parte do I, o
aborto deve ser precedido de “consentimento da gestante, ou, quando menor ou
incapaz, ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do
cônjuge ou de seu companheiro”.
Presentemente, uma ADPF - ação de descumprimento de preceito fundamental -, de número 442, proposta pelo PSOL, em que se discute a criminalização do aborto até a décima-segunda semana de gestação. A ministra Rosa Weber, relatora da ação, abriu audiências públicas para ouvir prós e contras a criminalização, e, então, levar a julgamento.
Presentemente, uma ADPF - ação de descumprimento de preceito fundamental -, de número 442, proposta pelo PSOL, em que se discute a criminalização do aborto até a décima-segunda semana de gestação. A ministra Rosa Weber, relatora da ação, abriu audiências públicas para ouvir prós e contras a criminalização, e, então, levar a julgamento.
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