O
“nomen juris” deste delito leva a pessoa a imaginar se alguém seria “louco” o bastante
para acusar-se de um crime que não existiu ou que não foi cometido por ele,
chegando a questionar se tal conduta deveria existir como crime. Existe no Brasil e
está definida no artigo 341 do Código Penal: “acusar-se, perante a autoridade,
de crime inexistente ou praticado por outrem”. A pena é de detenção, de 3 meses
a 2 dois anos, ou multa.
O
“príncipe dos penalistas brasileiros”, Nélson Hungria, que presidiu a comissão
que reviu o projeto de Código Penal preparado por Alcântara Machado, em sua
obra “Comentários ao Código Penal” (na realidade, uma obra coletiva, de que
participaram outros juristas: Roberto Lyra e Romão Gomes de Lacerda, por
exemplo), assim se manifesta: “tal fato, embora não comum, pode ocorrer e tem
ocorrido por vária motivação: ora por interesse pecuniário (isto é, mediante
paga do verdadeiro culpado ou de quem por ele se interesse), ora para afastar a
acusação de outro crime realmente praticado pelo autoacusador (ex.: para obter
um álibi em relação ao homicídio que praticou, um indivíduo se acusar de um
furto ocorrido em outro local distante e de autoria ignorada), ou por espírito
cavalheiresco ou de sacrifício altruístico (para salvar o verdadeiro criminoso,
que é seu amigo ou parente querido), ou para assegurar-se, com a prisão, abrigo
e alimento, etc. etc.” (volume 9, páginas 468 e 469).
Há
ao menos mais quatro motivos que podem levar uma pessoa a praticar esse delito,
que é classificado como “contra a administração da Justiça”. Busca de
notoriedade, doença mental, beneficiar-se com a sua atitude ou ser obrigado a
assumir a autoria de um delito cometido por outrem. Pelo primeiro motivo, já em
franco desuso, num caso de homicídio de uma pessoa respeitada, ou temida, cujo
autor não é descoberto nas investigações, alguém admite havê-la matado para tornar-se
conhecido e respeitado no “baixo mundo” (como se dizia antigamente). Pelo
segundo motivo, uma pessoa portadora de doença mental, ao saber de um crime que
abalou a opinião pública, assume a sua autoria. O terceiro motivo ocorria
sempre que uma pessoa pretendia beneficiar-se da figura do crime continuado,
com o aumento da pena de apenas um deles de 1/6 a 2/3, mas faltava um crime
para completar a série e ele “adquiria” esse delito, assumindo a sua autoria, e
com isso tendo uma redução de pena. Por exemplo: a pessoa foi acusada de 3 furtos
qualificados, cometidos nos dias 10/1, 9/2 e 9/4. Poderia ser reconhecido o
crime continuado entre os dois primeiros, já que havia menos de trinta dias
entre eles, mas não com o terceiro. A sua pena, seria, então de 2 anos e 4 meses pelos dois primeiros (em vez de 4
anos) e mais 2 anos pelo terceiro, totalizando 4 anos e 4 meses. Se ele
houvesse praticado mais um furto, no mês de março, o cálculo da pena seria
outro e mais benéfico, 2 anos e 6 meses (a pena de somente um deles, 2 anos, aumentada de 1/6 pelos outros três). Então, ele “adquiria” esse furto de
cum companheiro de prisão e se beneficiava.
Pelo
último motivo – coagido a assumir a autoria do delito – vi diversas vezes
enquanto atuava perante a Vara do Júri pela PAJ Criminal: um dos presos, por
motivo que não vem ao caso, era morto pelos demais, e um deles era “escalado”
para assumir a autoria. Da mesma forma, quando coordenava o serviço de
assistência jurídica nos presídios da região, vi em algumas oportunidades
presos serem “escalados” para assumir a posse de celular ou de partes deles.
Naquela época não era ainda delito descrito no Código Penal, nem mesmo falta
grave prevista na Lei de Execução Penal. Aqui, caberia falar na "coação (moral) irresistível, mas isto será feito oportunamente. Pois é, a conduta é criminalizada e tem ocorrido.
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