Pular para o conteúdo principal

Corrupção e "mensalão"

A palavra "corrupção" tem sido largamente empregada no Brasil como sinônimo daquela prática que ocorre na Administração Pública: a vantagem (indevida) solicitada ou recebida por funcionário para a prática de ato de ofício, ou seja, de ato que esteja no rol de suas funções. Ela tem outros significados e basta "passar os olhos" pelo livro "Sociologia da corrupção" para conhecê-los. "Furar fila", por exemplo, é um ato de corrupção. Lembrando que a palavra deriva do verbo corromper e que este tem como significados deteriorar, adulterar (e outros), fica fácil entender tudo o que ela representa.
Há um ranking mundial da corrupção, referindo-se, por assim dizer, à corrupção da administração pública, renovado anualmente, e nele constata-se que a Dinamarca e a Nova Zelandia são os países menos corruptos do mundo, com nota atribuída de 9,8 (o máximo, óbvio, é 10. O Brasil obteve, como era de se esperar, uma mísera nota 3,8, figurando abaixo do sexagésimo lugar. Nào há nenhuma novidade.
A corrupção que se refere à atividade da Administração Pública está prevista como crime no artigo 317 do Código Penal e tem como pena a reclusão, de 2 a 12 anos, mais multa, que pode ser fixada entre 10 a 360 dias-multa, cada um no valor entre 1/30 do salário mínimo até 5 vezes o salário mínimo. Se a pena aplicada não supererar 4 anos, poderá haver a substituição por pena restritiva de direitos e fixação de regime de cumprimento aberto (prisão albergue).
 A ação penal 470, apelidada pela mídia de "mensalão" (parece que quem utilizou pela primeira vez a expressão foi o delator da prática, Roberto Jefferson), que tem sido apontada como o mais rumoroso processo já julgado pelo STF, cuida, com relação a diversos réus - são 40 no total (qualquer semelhança com a quadrilha dizimada por Ali Babá é mera coincidência...), justamente desse crime: a corrupção passiva (entre outros: peculato, lavagem de capitais, quadrilha). Porém, pode-se dizer que o mais rumoroso processo julgado pelo STF foi aquele em que o acusado, e por esse mesmo crime, era um ex-presidente da República, Fernando Collor de Mello, cujo desfecho foi a sua absolvição. Na ação penal 470 não há ex-presidente como réu.
Sob outro aspecto é o mais rumoroso: alguns segmentos da opinião pública têm se mobilizado no sentido que os acusados sejam condenados, mas esta é uma atitude perigosa. Sim, porque, quando alguém - especialmente se for leigo - pede a condenação de alguém que está sendo processado está, em primeiro lugar, usurpando a função do Poder Judiciário (sim, porque já julgou); em segundo lugar, não conhece o conteúdo dos autos do processo ("o que não está nos autos não está no mundo"; "o mundo do juiz é o mundo do processo"); em terceiro lugar, porque está pretendendo que o Poder Judiciário tome uma atitude que talvez não pretenda tomar.
Em favor do STF é de se dizer que ele é o único tribunal superior do mundo que transmite as suas sessões ao vivo, ou seja, mais "transparência" do que isso é impossível. É só aguardar o desfecho.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A memória

A BBC publicou tempos atrás um interessante artigo cujo título é o seguinte: “O que aconteceria se pudéssemos lembrar de tudo” e “lembrar de tudo” diz com a memória. Este tema – a memória- desde sempre foi – e continua sendo – objeto de incontáveis abordagens e continua sendo fascinante. O artigo, como não poderia deixar de ser, cita um conto daquele que foi o maior contista de todos os tempos, o argentino Jorge Luis Borges, denominado “Funes, o memorioso”, escrito em 1942. Esse escritor, sempre lembrado como um dos injustiçados pela academia sueca por não tê-lo agraciado com um Prêmio Nobel e Literatura, era, ele mesmo, dotado de uma memória prodigiosa, tendo aprendido línguas estrangeiras ainda na infância. Voltando memorioso Funes, cujo primeiro nome era Irineo, ele sofreu uma queda de um cavalo e ficou tetraplégico, mas a perda dos movimentos dos membros fez com que a sua memória se abrisse e ele passasse a se lembrar de tudo quanto tivesse visto, ou mesmo (suponho) imaginado...

Uma praça sem bancos

Uma música que marcou época, chamada “A Praça”, de autoria de Carlos Imperial, gravada por Ronnie Von no ano de 1967, e que foi um estrondoso sucesso, contém uma frase que diz assim: “sentei naquele banco da pracinha...”. O refrão diz assim: “a mesma praça, o mesmo banco”. É impossível imaginar uma praça sem bancos, ainda que hoje estes não sejam utilizados por aquelas mesmas pessoas de antigamente, como os namorados, por exemplo. Enfim, são duas ideias que se completam: praça e banco (ou bancos). Pois no Cambuí há uma praça, de nome Praça Imprensa Fluminense, em que os bancos entraram num período de extinção. Essa praça é erroneamente chamada de Centro de Convivência, sendo que este está contido nela, já que a expressão “centro de convivência (cultural)” refere-se ao conjunto arquitetônico do local: o teatro interno, o teatro externo e a galeria. O nome Imprensa Fluminense refere-se mesmo à imprensa do Rio de Janeiro e é uma homenagem a ela pela ajuda que prestou à cidade de Campi...

Legítima defesa de terceiro

Um dos temas pouco abordados pelos doutrinadores brasileiros é o da legítima defesa de terceiro; os penalistas dedicam a ele uma poucas páginas, quando muito. Essa causa de exclusão da ilicitude vem definida no artigo 25 do Código Penal: “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. Nessa definição estão contidos os elementos da causa de exclusão em questão: uso moderado dos meios necessários; existência de agressão atual ou iminente; a direito seu ou de outrem. Como se observa facilmente, a defesa é um repulsa a uma agressão, ou seja, é uma reação a uma agressão, atual (que está acontecendo) ou iminente (que está para acontecer). Trata-se, a causa de exclusão em questão, de uma faculdade que o Estado põe à disposição da pessoa de defender-se pois em caso contrário a atuação estatal na proteção dos cidadãos tornar-se-ia inútil. Não é uma obrigação, é uma faculdade. Caso, na...