Era
tarde da noite: eles chegaram ao bar, com cadeiras e mesas na parte externa, ambos
com os rostos cobertos por camisetas, à guisa de máscaras, ambos armados e foi
dada a ordem: “todos no chão, é um assalto”. Todos os presentes deitaram-se no
chão, de bruços. Um daqueles mascarados fez vários disparos contra uma das
pessoas; não contente em atingi-la, desferiu pontapés em seu rosto; ainda
descontente, atirou-lhe um tijolo baiano no rosto. Quando se retiravam do
local, um daqueles “assaltantes” – nada porém foi levado, já que o “assalto”
era uma simulação – retirou a camiseta que escondia o seu rosto; foi a sua
perdição: ao ouvirem o som do primeiro disparo, dois frentistas de um posto de
um gasolina nas imediações correram ao local e viram quando aquela pessoa
retirava a camiseta que lhe escondia a face e viram-na.
A
polícia investigou e conseguiu chegar a um dos autores do fato, precisamente o
que havia feito os disparos, chutado o rosto da vítima e atirado nela um tijolo
baiano. Descobriu que entre ele e o morto – que trabalhava num posto de
gasolina – havia ocorrido um desentendimento. Decretada a prisão temporária,
depois a prisão preventiva, ele sempre negava a prática do fato.
Depois
de processado e pronunciado, o seu advogado renunciou ao mandato e, não tendo o
acusado constituído defensor, foi nomeada a PAJ para defendê-lo. Tão logo tomei
ciência da nomeação, estive no presídio para conversar com ele e, inicialmente,
ele negou haver sido o autor do crime. Disse-lhe que havia uma testemunha que o
reconhecera, pois vira quando ele, deixando o local do crime, retirara a
camiseta que lhe escondia o rosto. Indaguei se ele não havia cometido o crime e
a resposta foi negativa. Se tivesse sido ele, talvez houvesse explicação para a
fúria com que ele agredira e matara a vítima.
Requeri
ao juiz a reprodução simulada dos fatos (“reconstituição”) a partir da visão da
testemunha “ocular”, que deveria ser feita no mesmo horário, a fim de que fosse
a mais fiel possível. Para decepção, o local havia sido demolido: a
“reconstituição” foi realizada, porém infrutífera.
No
dia do julgamento, fui conversar com ele na cela do primeiro andar do fórum e
ele me perguntou se teria algum efeito ele admitir perante os jurados ter sido
o autor do crime. Respondi-lhe que, àquela altura, já tendo negado por duas
vezes, os jurados dificilmente acreditariam nele.
Familiares
da vítima, portando fotos ampliadas, sentaram-se nas primeiras fileiras do
salão do júri e a todo o tempo exibiam-nas aos jurados.
A
única tese cabível era a negativa de autoria – uma das mais difíceis,
especialmente quando há testemunha “ocular” – e foi por mim sustentada em
plenário. Porém, os jurados, por seis votos a um, reconheceram ter sido o réu o
autor daquele grave crime.
Não
restou alternativa ao magistrado se não impor ao acusado a pena de 14 anos de
reclusão.
(Capítulo do livro "Casos de júri e outros casos", Editora Millennium.)
(Capítulo do livro "Casos de júri e outros casos", Editora Millennium.)
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