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O roubo, a câmera e a reação



            “Bombou”, nas redes sociais (entenda-se: Facebook e Twitter), nos portais, nos telejornais, enfim, em toda a mídia, a gravação em vídeo de um roubo qualificado pelo emprego de arma (de fogo) e concurso de pessoas de uma motocicleta, que, graças à intervenção de um oficial da Polícia Militar que passava pelo local, não chegou a consumar-se, pois um dos ladrões, o que estava armado e havia se apossado do bem, foi atingido por projéteis disparados pelo policial.
            O evento pôde ser gravado porque o motociclista vítima tinha acoplada ao seu capacete uma câmera que está muito em voga na atualidade: uma Hero (são vários modelos; a Sony tem um modelo que concorre com essa marca). Pela gravação vê-se a ousadia com que agem os ladrões de moto (e de todos os veículos, diga-se), interceptando a vítima, em plena luz do dia e num cruzamento movimentado da cidade, segurando no guidão do veículo e, com a arma apontada para o rosto do sujeito passivo, ordena a entrega do veículo. A cena me fez lembrar os programas veiculados nos canais Animal Planet, Discovery Channel ou NatGeo sobre predadores na África: hiena “roubando” a presa que o leopardo (ou o guepardo) abateu, ou os leões (e, principalmente, as leoas) “roubando” as presas desses predadores. Ou os ursos no Alasca “roubando” salmões uns dos outros. Um penalista italiano antigo dizia que o crime é uma regressão atávica e eu acrescentaria: regressão animal. Caído no chão, acabou a empáfia e a ousadia do ladrão e ele passou a falar como um autêntico egresso da Fundação Casa ou do sistema carcerário, sempre colocando nas frases a palavra "senhor", como a demonstrar respeito, respeito esse que ele não teve enquanto dominava a situação, enquanto agia como predador.
            Todas as pessoas que se veem nessa situação de vítima, creio, o primeiro pensamento que têm é não sofrer dano pessoal e o segundo é na polícia. Pois não é que se materializou um policial militar e “deu voz de prisão” ao ladrão e, ante o seu gesto de que iria sacar a arma (a mesma que utilizara na rapina), fez alguns disparos contra ele, atingindo-o duas vezes. A não ser que os meus olhos tenham me enganado, vi no gesto do militar um exemplo claro de legítima defesa de terceiro e própria: reação a uma agressão atual (o roubo ainda não se consumara), injusta, uso moderado dos meios necessários. Legítima defesa própria se deu na modalidade agressão iminente, pois o rapinante fez menção de empunhar a arma. Ressalto o seguinte: ele não efetuou os disparos para impedir o roubo, mas sim ante a tentativa do ladrão de empunhar a arma de fogo que portava. Se fosse apenas para impedir a subtração, talvez não se pudesse falar em legítima defesa, mas este é outro assunto.
            O vídeo “bombou” nas redes sociais: qual a razão disto? É que as pessoas não suportam mais a situação de descontrole da violência, o estado de intranquilidade em que se vive atualmente, com a criminalidade atingindo níveis estratosféricos, a cada dia surgindo uma nova modalidade de ataque ao patrimônio. Furtos em caixas eletrônicos, “saidinha” de banco, roubos e furtos de veículos, gang da marcha à ré, sequestros relâmpagos, arrastões. Tudo isso ocorrendo num país que tem uma das maiores tributações do mundo e que não é revertida em benefício dos cidadãos;  serviços igualmente caros, como, por exemplo: nesta “terra descoberta por Cabral”, o minuto da telefonia celular é o mais caro do mundo.
            Pois é: esperamos todos que, se – toc-toc-toc na madeira – formos vítimas de um crime um dia, um policial esteja passando pelo local e, tal qual um anjo da guarda, nos livre do mal, amém.


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