Pular para o conteúdo principal

Código Penal - I

Todo Código Penal tem duas partes: a geral e a especial. Na primeira estão os dispositivos legais aplicáveis a todos os crimes (legítima defesa, concurso de pessoas [fenômeno em que várias pessoas participam do mesmo crime], formas de cumprimento da pena [regimes: aberto, semi-aberto e fechado], livramento condicional, etc); na segunda estão definidos os crimes em espécie (homicídio, extorsão mediante sequestro, peculato). A parte geral do nosso código é de 1984; a especial, de 1940. Quando a mídia afirma que o nosso código é muito antigo, está evidentemente referindo-se à parte especial (mas ela não sabe disso...). E, a partir dessa afirmação, faz outra, como consequência: que é necessário um novo código. É óbvio que nos anos posteriores a 1940 (e são anos...) os valores que surgiram e mereceram proteção penal tiveram essa tutela deferida por leis extravagantes: meio ambiente, porte ilegal de arma, entorpecentes (quatro leis; a última trata do assunto como "drogas").
O senador Sarney, para tentar mostrar que tem alguma utilidade à nação, na condição de presidente do Senado da República nomeou uma comissão para redigir um anteprojeto de Código Penal e membros dessa comissão estiveram em São Paulo no dia 24 de fevereiro para, em audiência pública, ouvir sugestões sobre novidades que deveriam constar do projeto. Repetiu-se aquele espetáculo já conhecido: parentes de vítimas, principalmente mortas (por homicídio, latrocínio ou qualquer outro que produza a morte), com camisetas ostentando a foto da vítima, estiveram no local. É triste isso, mas plenamente compreensível: APENAS parentes de vítimas comparecem e o pedido é sempre o mesmo: lei penal mais rígida especialmente quanto ao crime que atingiu o seu familiar. A ocorrência padrão desse comportamento deu-se com a novelista Glória Perez quando foi a sua filha Daniella morta por Guilherme de Pádua, que percorreu o Brasil colhendo assinaturas para um projeto de lei que transformasse o homicídio qualificado em crime hediondo. Embora tendo a assistência de conceituado escritório de advocacia do Rio, e embora tenha conseguido modificar a lei, ela não foi avisada que a lei penal não pode retroagir para prejudicar: o matador teve a progressão de regime, o que, na época, era vetado pela lei de crimes hediondos (nº 8.072/90).
Algumas novidades que constarão do anteprojeto já foram anunciadas por alguns membros da comissão, mas sobre elas eu falarei numa próxima ocasião.
Silvio Artur Dias da Silva

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Uma praça sem bancos

Uma música que marcou época, chamada “A Praça”, de autoria de Carlos Imperial, gravada por Ronnie Von no ano de 1967, e que foi um estrondoso sucesso, contém uma frase que diz assim: “sentei naquele banco da pracinha...”. O refrão diz assim: “a mesma praça, o mesmo banco”. É impossível imaginar uma praça sem bancos, ainda que hoje estes não sejam utilizados por aquelas mesmas pessoas de antigamente, como os namorados, por exemplo. Enfim, são duas ideias que se completam: praça e banco (ou bancos). Pois no Cambuí há uma praça, de nome Praça Imprensa Fluminense, em que os bancos entraram num período de extinção. Essa praça é erroneamente chamada de Centro de Convivência, sendo que este está contido nela, já que a expressão “centro de convivência (cultural)” refere-se ao conjunto arquitetônico do local: o teatro interno, o teatro externo e a galeria. O nome Imprensa Fluminense refere-se mesmo à imprensa do Rio de Janeiro e é uma homenagem a ela pela ajuda que prestou à cidade de Campi...

Legítima defesa de terceiro

Um dos temas pouco abordados pelos doutrinadores brasileiros é o da legítima defesa de terceiro; os penalistas dedicam a ele uma poucas páginas, quando muito. Essa causa de exclusão da ilicitude vem definida no artigo 25 do Código Penal: “entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. Nessa definição estão contidos os elementos da causa de exclusão em questão: uso moderado dos meios necessários; existência de agressão atual ou iminente; a direito seu ou de outrem. Como se observa facilmente, a defesa é um repulsa a uma agressão, ou seja, é uma reação a uma agressão, atual (que está acontecendo) ou iminente (que está para acontecer). Trata-se, a causa de exclusão em questão, de uma faculdade que o Estado põe à disposição da pessoa de defender-se pois em caso contrário a atuação estatal na proteção dos cidadãos tornar-se-ia inútil. Não é uma obrigação, é uma faculdade. Caso, na...

Câmeras corporais

A adoção da utilização de câmeras corporais por policiais militares gerou – e gera – alguma controvérsia no estado de São Paulo, tendo sido feita uma sugestão que mais lembra um pronunciamento de Eremildo, o Idiota (personagem criado por Elio Gaspari): “os soldados da força policial usariam as câmeras, mas as ligariam apenas quanto quisessem”. Essa tola sugestão tem como raiz o seguinte: nas operações em que pode haver alguma complicação para o policial ele não aciona a câmera; mas demais, sim. Apenas a título informativo, muitos países do mundo tem adotado essa prática: em algumas cidades, como, por exemplo, nos Estados Unidos, até os policiais que não trajam fardas estão utilizando esses aparatos. Mas, a meu ver, o debate tem sido desfocado, ou seja, não se tem em vista a real finalidade da câmera, que é a segurança na aplicação da lei penal, servindo também para proteger o próprio agente da segurança pública (tendo exercido, enquanto Procurador do Estado, a atividade de Defensor...